Páginas

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Pijama apertado

O sistema previdenciário do Acre é uma bomba-relógio prestes a explodir. O número crescente de aposentados e pensionistas sem o respectivo aumento nas contribuições tem gerado um déficit mensal para o Acreprevidência de R$ 9 milhões. A falta de uma política para o setor de longo prazo é o principal motivo para um possível colapso da previdência estadual num futuro nem tão distante.

O gerenciamento do fundo previdenciário acreano esteve nos últimos dias no centro dos debates entre oposição e base na Assembleia Legislativa. Os oposicionistas criticam o Palácio Rio Branco por não seguir o governo federal na antecipação do pagamento de benefícios para aposentados e pensionistas atingidos pela cheia histórica do rio Acre.

Também questionam como este fundo vem sendo gerido, preocupados com possíveis investimentos em ações da Petrobras, que registram desde meados do ano passado perda de valor nas bolsas. Para tratar o assunto com seriedade diante de sua vital importância para o Acre, Contilnet Notícias entrevistou o presidente do Acreprevidência, José de Anchieta Batista.

Ele está no cargo desde o início da criação do instituto, no governo Binho Marques (2007-2010), quando de fato o Acre passou a ter seu regime próprio de previdência. Apontado como o nome mais experiente para tratar do setor, Ancheita tem sido mantido nos governos de Tião Viana.

“O déficit previdenciário não é uma dívida criada por nosso governo. É uma pendência histórica que vem sendo gerada desde 1962”, diz Anchieta, que ainda alerta: “A futura falta de recursos é uma realidade. As contribuições serão cada vez mais insuficientes para cobrir os pagamentos.”

Abaixom a entrevista

Contilnet: A oposição tem questionado o real valor hoje disponível no fundo previdenciário do Acre. Afinal de contas, quanto o Estado tem assegurado neste fundo para garantir a segurança da aposentadoria dos servidores públicos?

Anchieta: Esta resposta está permanentemente respondida, desde 2006, na página do Acreprevidência. O último demonstrativo publicado foi o do mês de fevereiro/2015. Estamos trabalhando o de março. A cifra de R$ 280 milhões foi em meses passados. Agora, estamos com algo em torno de 260 milhões..  O número de aposentados e pensionistas tem aumentado consideravelmente e, por isso, o valor da folha vem gerando uma diferença mensal (entre as contribuições e a despesa) da ordem de R$ 9 milhões. Os recursos advindos da compensação previdenciária e dos rendimentos de aplicações têm sido insuficientes para cobrir este crescente déficit.

Contilnet: E quando esses recursos se exaurirem?

Anchieta: O déficit previdenciário não é uma dívida criada por nosso governo. É uma pendência histórica que vem sendo gerada desde 1962, com a admissão de servidores pelo Estado do Acre. O ponto central: nunca houve uma poupança garantidora dos benefícios. O Acreprevidência foi criado já com cerca de 3.500 benefícios e sem qualquer reserva financeira. O que se arrecadava no mês era usado para cobrir o próprio mês. O Estado não tinha como fazer um aporte. Hoje temos mais de 10.000 benefícios.   A futura falta de recursos é uma realidade. As contribuições serão cada vez mais insuficientes para cobrir os pagamentos. Tudo isso tem sido uma preocupação nossa. Já está em andamento um grande projeto de captação de recursos por meio de fontes alternativas, como é o caso da transferência de imóveis para monetização pelo Fundo de Previdência. Também estão adiantados os estudos para implementarmos projetos inovadores que venham gerar novos recursos, oriundos de: carbono, florestamento, reflorestamento, manejo, compensação de florestas, etc

Contilnet: Outro ponto em questão são os investimentos aplicados pelo fundo para sua capitalização. Questiona-se uma possível perda de capital por aplicações em ações da Petrobras, já que a estatal do petróleo vem perdendo valor de mercado. O Acreprevidencia de fato investiu em papéis da Petrobras? Houve perdas? 

Anchieta: As insinuações são totalmente infundadas. Todos os nossos recursos estão aplicados em fundos geridos pelo Banco do Brasil e pela Caixa Econômica Federal (bancos públicos). Não gerimos diretamente. Eles nos mostram a análise do quadro nacional e internacional, nos apresentam probabilidades e nós decidimos onde queremos o recurso. Depois, fazemos o acompanhamento. Um dos nossos diretores possui a CPA-20 (Certificação Profissional Anbima – Série 20).  Nunca fizemos aplicações diretas em ações de qualquer empresa. Some-se a isso que obedecemos religiosamente os preceitos existentes em resoluções do Banco Central as regras ditadas pelo Conselho Monetário Nacional. Isto tudo, sob o olhar vigilante do Ministério da Previdência, do Banco Central (cujas análises de fundos resultaram nos escândalos já conhecidos), do Tribunal de Contas do Estado, do CEPS (Conselho Estadual de Previdência Social) e ainda do Conselho Fiscal.

Contilnet: Qual a política do instituto para aplicar estes recursos com segurança, garantir retornos, além de conter danos por prejuízos normais neste volátil mercado de ações?

 Anchieta: É bom salientar que, embora tenhamos recebido propostas de entidades e bancos privados, nunca abrimos mão da preferência pelos bancos públicos. Sabe-se que ninguém, seja entidade financeira pública ou privada, se responsabiliza pelas variações negativas do mercado. Temos, contudo, uma convicção de que existem maiores dificuldades de haver falcatruas nos Fundos de Investimentos administrados por instituições bancárias públicas.

Contilnet:  O fundo de previdência do Acre já foi usado indevidamente por governos passados para conter rombos nas contas públicas. Qual a garantia o servidor público tem de que este dinheiro não será mais usado em malabarismos fiscais?

Anchieta: A Lei Complementar nº 39, de 29 de dezembro de 1993, ao criar o Estatuto do Servidor Público, incluiu os dispositivos de uma previdência própria. Quando, em 1996, o fundo já acumulara R$ 43 milhões, isto sem um centavo sequer dos 13% de contribuições previstas para o empregador, foi editada a Lei Complementar nº 52, de 24/10/96, extinguindo o Fundo e revertendo o saldo para o Tesouro Estadual. Hoje ainda aparece quem reclame não se buscar na Justiça a responsabilidade dos governantes da época. Isso é uma tolice. Realmente não sei em que os recursos foram aplicados. Isso é outra história, mas a reversão ao Tesouro foi feito com permissão da lei. Naquele tempo isto foi possível, hoje há vedações legais. Há uma espécie de blindagem. Como sabemos, compete privativamente à União legislar sobre seguridade.  Assim, as vedações não nasceram em legislação acreana, embora haja um dispositivo na lei estadual que reforça isto. Hoje, muitos e muitos gestores e ex-gestores públicos estão vivendo maus momentos pela utilização inadequada de recursos previdenciários. Soube hoje que existe na Aleac uma proposta de alteração da lei estadual para que seja possível seguir o comportamento do INSS, para possibilitar a concessão de empréstimos aos aposentados e pensionistas  do Estado, em razão de “calamidade pública”. Com todo respeito, esta providência é algo inócuo. Tem-se que alterar, lá em Brasília, a Lei 9717/1998.

Nenhum comentário:

Postar um comentário