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segunda-feira, 27 de maio de 2019

Para inglês e (alemão) ouvir

Gladson Cameli (de chapéu) em feira rural de RO fala mal da pauta ambiental, após elogiá-la para "gringos"



Na semana que passou, ninguém melhor do que o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), para se encaixar na definição de “metamorfose ambulante” - e este ambulante não é só pelas suas constantes viagens às custas do erário.

Gladson começou a segunda como o mandatário mais ecologicamente correto da história recente do Acre (amigo da floresta), e terminou a sexta comendo churrasco com os ruralistas de Rondônia, afirmando que as porteiras do Acre estão abertas para o agronegócio - o que inclui um pouco de desmatamento.

Tal mudança de comportamento - vista como antagônica já que ambientalismo e ruralismo quase sempre estão em lados opostos - tem uma explicação - e ainda bem.

Na segunda-feira 20 de maio, o governador abriu as portas do gabinete para receber alemães e britânicos que por aqui, nos últimos anos, aplicam seus recursos como tentativa de manter alguma coisa da Floresta Amazônica em pé.

São estes dólares, euros e libras esterlinas que vêm assegurando algum fôlego para os investimentos por parte do Executivo, ante um orçamento bastante comprometido com a inchada folha de pagamento  do funcionalismo público.

A maior parte destes recursos é injetada pelo banco alemão estatal de desenvolvimento, o KFW. Seus dirigentes, membros da embaixada da Alemanha e da Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ) vieram ao Acre para ver como suas doações estão sendo aplicadas. Também integrou a comitiva internacional representantes do governo do Reino Unido.

Diante dos europeus, Gladson Cameli foi só amores com a causa ambiental, tão defenestrada por ele e seus aliados nos últimos anos, enquanto estiveram na oposição, acusando os petistas de travarem o desenvolvimento do Acre por conta da agenda ambiental.

“Nosso Governo não é a favor que se acabe com a floresta e não trabalhamos com essa possibilidade. Queremos usar o potencial que nós já temos para que possamos nos tornar um Estado produtivo, que gere emprego e renda para o nosso povo. A continuidade desta parceria vai ser fundamental para que possamos alcançar esse objetivo”, disse o anfitrião aos convidados.

Gladson Cameli, claro, está de olho nos quase R$ 2 bilhões que apenas o governo da Alemanha investirá nos próximos anos na preservação de florestas tropicais ao redor do mundo, com o Acre podendo comer uma fatia deste bolo. Para isso, o governo precisa fazer sua parte e combater o desmatamento ilegal.

Para cada árvore colocada no chão, o estado deixa de receber verba internacional - ou seja, menos floresta, menos dinheiro em caixa.  Apenas nos últimos cinco anos o Acre recebeu R$ 115 milhões de doadores estrangeiros por ter mantido preservada 87% de sua cobertura florestal nativa.

A porteira está aberta 

Porém, nem bem alemães e britânicos deixaram seu gabinete, e Gladson Cameli já estava de malas prontas para ir ao estado vizinho, onde participaria da Rondônia Rural Show. Sua intenção estava clara: reforçar o convite para os grandes produtores agropecuários aplicar seus investimentos no Acre. Desde o começo do ano ele tem ido a Rondônia buscar potenciais investidores rurais para o Acre. 

Em termos ambientais, Rondônia é um dos estados da Amazônia Legal que mais perderam sua cobertura florestal para o agronegócio. Em questão de horas, Gladson esqueceu todo o seu lado ecologicamente correto e colocou o chapéu de vaqueiro para escancarar as porteiras do Acre para a soja e outras culturas.

“As pessoas quando falam de Amazônia, só falam de preservação. O Acre está aberto para o agronegócio, a pecuária, a soja, a industrialização. E quem quiser investir, pode ir com toda a segurança que o estado dará. A nossa ideia é seguirmos esse modelo de desenvolvimento, adotado por Rondônia, porque temos tudo para fortalecer nossa economia”, disse Cameli aos produtores rondonienses.

Por segurança, vale ressaltar, não é essa que a população carece diariamente, com a bandidagem “tocando o terror” pelas ruas das cidades acreanas. Mas a destes fazendeiros fazerem o que bem quiserem por aqui dentro de suas áreas, sem ser incomodados pela fiscalização ambiental.

Como se vê, a “metamorfose ambulante” retrata o quão voláteis  são as declarações do governador do Acre - que ora acende uma vela para o Divino, e ora para o capeta. Ao que tudo indica, as suas palavras sobre a defesa da Floresta Amazônica não passaram de puro casuísmo  para inglês e alemão verem e ouvirem. 

sábado, 25 de maio de 2019

Alerta vermelho


A Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong) emitiu nota na qual condena a tentativa do ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) de desqualificar os trabalhos desenvolvidos por ONGs e associações indígenas com recursos do Fundo Amazônia.

Para a entidade, projetos executados pelo terceiro setor têm essencial junto às comunidades para manter intacta a Floresta Amazônica, tão ameaçada pelo desmatamento ilegal que atua para transformá-la em áreas de pastagem e plantio de soja.


Leia a íntegra da nota:



Fundo Amazônia: Uma conquista do Brasil em risco!

A Amazônia é o maior bioma de floresta ainda existente no Planeta Terra. É responsável pelo equilíbrio ambiental do planeta. Sua preservação e manejo sustentável é essencial para sua manutenção. Por isso, populações indígenas, comunidades tradicionais e organizações da sociedade civil brasileira e internacionais não poupam iniciativas para sua preservação. O Governo Brasileiro é o gestor legítimo destes esforços e sua postura deveria ser favorável a sua preservação sem perder a soberania nacional sobre este território.

Uma das iniciativas é o Fundo Amazônia, gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em cooperação com o Ministério do Meio Ambiente para apoiar projetos de conservação e uso sustentável da Amazônia. As atividades produtivas de caráter comunitário e com uso sustentável de recursos naturais da sociobiodiversidade da Amazônia (açaí, castanha, cacau, pirarucu, fibras etc.) geram renda e desenvolvimento econômico-social para essas populações. Mas, além disso, estimulam essas comunidades a aderirem de forma natural à manutenção e valorização da floresta em pé, porque a natureza passa a ser a fonte dos recursos que garantem seu sustento e seu crescimento econômico.

O Ministro do Meio Ambiente do Brasil, ao invés de cumprir seu papel institucional fortalecendo as ações deste Fundo, decidiu fazer uma revisão dos projetos ignorando todos os mecanismos de controle e auditorias realizadas, inclusive pelo TCU em 2018. Para isso, mobilizou esforços do MMA, do BNDES e da CGU contra os projetos realizados pelo povos indígenas, as comunidades tradicionais e ONGs baseado em de ilações, denúncias e desinformação com o objetivo de desmoralizar e criminalizar as atividades destes segmentos.

Para atingir seu intento, o Ministro não demonstrou os critérios e metodologias adotadas na análise, não trouxe nenhuma evidência de irregularidades, mas fez ilações irresponsáveis sobre as organizações da sociedade civil. Apenas enfatiza seu objetivo que é “acabar com o ativismo ambiental”.

A Abong, que representa mais de 200 organizações, defende o Fundo Amazônia resultado do Acordo de Cooperação com o Governo da Noruega e gerenciado pelo BNDES. Principalmente porque a doação que gerou o Fundo é um reconhecimento do sucesso das ações de conservação ambiental. Reitera a importância da participação da sociedade civil organizada e sua legitimidade para participar e executar projetos na Amazônia.

Rechaçamos qualquer iniciativa de criminalizar os povos indigenas, as comunidades tradicionais e as organizações da sociedade civil organizada que lutam para a conservação da floresta.

Abong – Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais

sexta-feira, 24 de maio de 2019

Uma luta constante

Não existe governo bom para índio, diz liderança Huni Kui do Acre 

As ofensivas do governo Jair Bolsonaro (PSL) para fragilizar e até acabar com os direitos dos povos indígenas do país não são vistas como novidades para a liderança Ninawá Huni kui.

“Uma coisa que deixo muito claro para o meu povo é que não existe governo bom para índio. Nunca existiu. Tudo o que os povos indígenas conquistaram até hoje foi com luta”, afirma.

As terras indígenas são o principal alvo de ataque do presidente da República, com a promessa de rever demarcações e não realizar novas Para Ninawá Huni kui, a atitude de rever terras demarcadas não será fácil ante o movimento de resistência das populações indígenas.

“Nós queremos que se respeite o nosso território. Que o nosso território não sejaj visto como comércio”, afirma ele.

Os Huni Kui realizaram essa semana sua quarta assembleia, reunindo representantes das mais de 100 aldeias espalhadas pelo Acre. Também chamados de Kaxinawá - nome dado pelos brancos que chegaram ao Acre no início do século passado para explorar a borracha - eles somam mais de 15 mil pessoas, em 12 terras indígenas.

Veja a entrevista concedida por Ninawá Huni kui ao blog enquanto organizava protestos de seu povo pelas ruas centrais de Rio Branco na última quarta, 22.


quarta-feira, 22 de maio de 2019

Por alguma força política

Em carta, povos indígenas do Acre pedem criação de secretaria no governo Gladson e apontam retrocessos 


Indígenas Huni Kui realizam protesto em frente à sede do governo do Acre



Em uma carta assinada por representantes de 26 terras indígenas do Acre - reunidos na semana passada em Rio Branco - foi reivindicada a criação de uma secretaria dentro do governo Gladson Cameli (PP) para tratar, de forma específica, as demandas das populações tradicionais do estado. 

Após quase seis meses sem nenhuma perspectiva de participação na gestão empossada em 1º de janeiro, os indígenas tiveram um sinal de espaço com a criação de um departamento dentro da Secretaria de Assistência Social, Mulheres e Direitos Humanos, criada a partir da “reforma da reforma administrativa” aprovada essa semana pela Assembleia Legislativa.

Até o momento não se sabe qual o tamanho nem como funcionará este departamento. Causou estranheza entre os representantes do movimento o fato de a estrutura ter ido para uma secretaria de assistência social, passando a impressão de que seu principal objetivo seria fazer mero “assistencialismo indígena”.

Em certo momento, chegou-se a ser especulado que o departamento ficaria sob a responsabilidade da Secretaria de Meio Ambiente (Sema), que tem maior afinidade para tratar da pauta indígena. Tanto assim, que as lideranças querem que os recursos recebidos pelo Acre de doações de organismos internacionais para ações nas áreas ambiental e indígena sejam administrados pela Sema.

Atualmente, este dinheiro é gerenciado pela Secretaria de Planejamento, extinta a fundida com a de Gestão Administrativa no pacote da “reforma da reforma”. Outro ponto defendido na carta é que financiadores como o banco alemão KFW, o Banco Mundial, o Interamericano de Desenvolvimento e o governo da Noruega repassem de forma direta recursos para as associações indígenas para que projetos dentro das comunidades sejam executados.

Ainda na carta os povos fazem críticas ao governo federal ante suas medidas de desmantelamento das políticas indígenas, como a desestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e o enfraquecimento da ações de saúde.



Leia a carta na íntegra:    



CARTA DAS LIDERANÇAS E ORGANIZAÇÕES INDÍGENAS DO ACRE PARA OS GOVERNOS E A SOCIEDADE 

Nós, lideranças indígenas, homens e mulheres, dos povos Ashaninka, Huni Kuĩ, Shawãdawa, Yawanawa, Nukini, Noke Koe (Katukina), Shanenawa, Puyanawa, Manxineru, Kuntanawa, Jaminawa, Madija de 26 terras indígenas do Acre e 29 associações indígenas, reunidos em Rio Branco, de 15 a 17 de maio, no Centro de Formação dos Povos da Floresta, para discutir a grave situação de retrocesso dos direitos indígenas frente aos ataques do governo federal, e a morosidade do governo estadual, em definir, participativamente, políticas para os povos indígenas.

A ofensiva do governo federal contra todos os povos indígenas se materializa no apoio ao agronegócio e compromissos com os ruralistas, mas também com outros setores poderosos que defendem arredamento e exploração de recursos naturais das terras indígenas; no descaso com as evidências e os impactos das mudanças do clima em nossas vidas; nas falsas afirmações de que somos povos que não produzem alimentos; no equivocado processo de integração, que somente aumenta a contra informação, o preconceito e a desigualdade. Não é isso o que defendemos e estamos dispostos a reverter essa situação. 

Com base em informações, reflexões, testemunhos e depoimentos sobre o cenário político; com informações e relatos sobre fatos concretos e a vida cotidiana em nossas terras indígenas, essa reunião visou fortalecer nossa aliança, nossa união, nossas organizações políticas e assim buscar estratégias de como vamos mudar essa situação.

Temos clareza de que os que querem nos prejudicar usam artimanhas como decretos, portarias, projetos de lei e outros, para mostrar que estão agindo dentro de uma chamada “legalidade”. Sabemos dos grandes desafios e temos certeza que essa reunião de lideranças é um momento de união que nos dá muito mais força para lutar pela manutenção dos nossos direitos. Sabemos o que queremos e que nesta terra permaneceremos por muitas gerações que virão. Isso é inquestionável.

Desta forma, após três dias de discussões, firmes e fortalecidos para reverter esse grave quadro, queremos que os governos respeitem e cumpram nossos direitos constitucionais, bem como o direito de Consulta Livre, Prévia e Informada, conforme estabelecido na Convenção 169 da OIT que é lei no Brasil (Decreto Presidencial n° 5051/2004), presente também na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (2007), e assim exigimos o que segue:

Governo Federal:

Que a FUNAI permaneça no Ministério da Justiça com suas atribuições institucionais e orçamento suficiente para funcionar e que retome os processos de demarcação das terras indígenas, como sua atribuição exclusiva, com o acúmulo de experiência que possui para esse trabalho;

Que seja revogado o Decreto Nº 9.709 de abril passado, que extingue os espaços de participação e diálogo dos povos indígenas, povos e comunidades tradicionais e sociedade civil com o governo federal;

Que seja cumprida a Política Especial de Saúde Indígena e as reivindicações das Conferências Locais, entre as quais: a) formação dos conselhos locais; b) contratação dos profissionais de saúde indígena por capacidade técnica; c) formação de agentes de saúde, enfermagem e técnicos de enfermagem; d) formação das equipes multidisciplinares sobre os povos indígenas; e) construção de postos de saúde, devidamente equipados nas terras indígenas; f) criação de um Centro de Referência no SECON para tratar do PCCU das mulheres indígenas, g) realização de campanhas educativas sobre bebida alcoólica e ilícitos;

Que seja reconhecida e valorizada a saúde tradicional;

Que seja feito um estudo sobre a situação da entrada e crescimento de ilícitos e que se investigue sobre a entrada de organizações criminosas em algumas terras indígenas e que seja feito um trabalho permanente de prevenção e diminuição desta situação nas comunidades.

Governo do Acre: 

Que seja criada uma Secretaria Especial Indígena para formulação e implementação de políticas para os povos indígenas no estado do Acre;

Que sejam incluídos na Lei Orçamentária Anual recursos específicos para investimentos em terras indígenas;

Que se promova com urgência o funcionamento da Comissão Estadual de Educação Indígena, da Comissão Estadual de Validação e Acompanhamento do SISA e sua Câmara Temática dos Povos Indígenas, assim como os demais espaços de participação e diálogo;

Que os programas, políticas e ações para as terras indígenas sigam o que está estabelecido na Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental (PNGATI);

Que seja garantida a execução do Programa REM, com atenção para: a) a manutenção dos recursos do Subprograma Territórios Indígenas nos componentes já estabelecidos, ampliando para as terras indígenas ainda não contempladas; b) o fortalecimento da Câmara Temática Indígena e criação de sua secretaria executiva; c) que os projetos contemplem recursos que garantam às associações indígenas equipe técnica e informação qualificada para a elaboração, execução e avaliação dos trabalhos nas terras indígenas;

Que seja mantido o PROSER destinado a todas as terras indígenas com as ações e recursos como foram pactuados nos dois últimos anos, com atenção para: a) a criação de uma instância de diálogo com os povos indígenas para o planejamento, monitoramento e avaliação; b) que os projetos sejam elaborados nas terras indígenas segundo suas especificidades e seus Planos de Gestão Territorial e Ambiental tendo como foco a soberania e segurança alimentar, proteção territorial e o fortalecimento cultural; c) que as associações sejam fortalecidas para gestão desses projetos; d) que seja garantida a continuidade e ampliação da formação dos agentes agroflorestais e a remuneração dos mesmos pelos serviços prestados; e) que a ATER Indígena seja realizada pelos agentes agroflorestais indígenas e sua organização de representação (AMAAIAC); f) que sejam fortalecidas as parcerias entre as organizações indígenas e indigenistas com a SEMA, IMC, SEPA, SEE, IMAC, FUNAI, IBAMA e SESAI para a necessária articulação entre as ações; e) que programas como PAA e PNAE recebam atenção para que possam viabilizar a regionalização da merenda escolar e geração de renda;

Que os recursos do Programa REM e PROSER, o que cabe aos povos indígenas, sejam geridos pela SEMA, que é o órgão mais estruturado para acompanhar as ações nas terras indígenas;

Que a Secretaria de Estado de Educação e a Universidade Federal do Acre se articulem com a Organização dos Professores Indígenas do Acre (OPIAC) para a criação de um programa de formação de professores indígenas em magistério;

Que a Comissão Estadual de Educação Escolar Indígena seja a instância responsável pela definição de critérios para o ingresso nos cursos de formação em magistério e licenciaturas indígenas;

Que sejam garantidos recursos para o desenvolvimento de pesquisas e produção de material didático pelos professores indígenas em parceria com a OPIAC, CPI-Acre e UFAC;

Que a SEE avance na articulação com a UFAC para garantir o acesso aos diversos cursos de graduação, implementando a política de cotas e de assistência estudantil;

Que se organize uma reunião com as associações indígenas que assinam esta carta para definições conjuntas sobre as políticas, programas e projetos do atual governo.

Por fim, informamos que outro ponto discutido foi sobre as parcerias e cooperação internacional e fazemos publicamente uma solicitação ao KfW, BIRD, BID, Governo da Noruega: que, diante do cenário acima colocado, considerem como necessário e urgente abrir linhas de financiamento direto para as associações indígenas, como uma maneira de continuar contribuindo com a defesa dos nossos direitos, com a proteção da maior floresta tropical do mundo e de sua sociobiodiversidade.

Com isso reafirmamos nossa disposição em nos mantermos unidos para romper com este momento de dor e injustiças contra nossos povos. Somos a fonte das informações para as nossas comunidades. Reafirmamos que pode sobrar um só indígena, mas nenhum de nós fugirá com medo de lutar por nossos direitos!
                                                                             
  Rio Branco, Acre, 17 de maio de 2019.

sábado, 18 de maio de 2019

Exemplo a seguir

A ministros das economias mais ricas, índios do Acre mostram seu papel na preservação do planeta


Na semana que passou, a Organização das Nações Unidas  (ONU) divulgou o mais completo estudo sobre a ameaça de extinção de espécies no planeta nos próximos anos. De acordo com a pesquisa, um milhão de espécies - entre animais e vegetais - correm o risco de desaparecerem se medidas urgentes não forem tomadas a partir de agora.

O estudo, o maior sobre biodiversidade, foi elaborado pela Plataforma Intergovernamental Sobre a Biodiversidade e os Serviços Ecossistêmicos (IPBES), deixando claro que ocorre neste momento “um declínio sem precedentes” para a sobrevivência das espécies.

Em meio a estas discussões, lideranças indígenas do Acre mostraram ao ministros do Meio Ambiente das sete economias mais ricas do mundo - o chamado G7 - o papel essencial  que suas comunidades desenvolvem dentro dos territórios tradicionais para a sua sobrevivência e das espécies que vivem no seu interior.

O uso dos recursos florestais de maneira equilibrada - de forma a tirar apenas o necessário - é uma das fórmulas encontradas pelos indígenas para garantir a vida desta e das futuras gerações.

Estes territórios, agora ameaçados pelo governo Jair Bolsonaro, que quer rever demarcações já realizadas, retardar ainda mais as que estão há décadas na fila de espera, além de permitir atividades como a mineração, cujos impactos ambientais seriam imensuráveis.     

"Aqui, vemos uma política muito ampla que é responsável por milhões de pessoas, e se a gente não escuta os melhores exemplos, os governos podem destruir todo um país. Para construir é difícil, mas para destruir é muito rápido. Vejo que a economia para dar certo, precisa ter humanidade”, disse Benki Piyãko, liderança do povo Ashaninka, cuja terra (a Kampa do Rio Amônia) está localizada em Marechal Thaumaturgo, Vale do Juruá.

O Juruá, por sinal, é a região do planeta com a maior concentração de biodiversidade. Benki participou nas últimas semanas de dois importantes fóruns mundiais para tratar do tema: um em Nova York, na sede da ONU, e outro na cidade francesa de Metz, onde ocorreu a reunião dos ministros do G7.

"Nosso povo tem uma história que diz: O bom guerreiro, um bom protetor, é homem de conhecimento e aquele que carrega no seu corpo e na sua vida pouca coisa. Não precisa levar um mundo, e a gente simplifica a maneira de viver", disse o Ashaninka, fazendo uma comparação entre o modo de vida simples das populações tradicionais, e a sociedade de alto consumo do dito “mundo civilizado”.     

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Terra (indígena) à vista!

Acre vai licenciar construção de linhão até o Juruá que passará por terra indígena 


O governo do Acre será o responsável pelo licenciamento ambiental da obra federal de construção da linha de transmissão de energia - o linhão - que sairá de Sena Madureira e vai até Cruzeiro do Sul, no Vale do Juruá. As torres serão erguidas às margens da BR-364 e terão que passar por dentro de uma terra indígena, a Campinas/Katukina.

Com a estadualização do processo de licenciamento, o governo espera reduzir em até quatro anos o tempo de espera que ocorreria se a licença tivesse que ser feita pelo órgão federal responsável, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, o Ibama.

A assinatura do termo que transfere o licenciamento do Ibama para o Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac) ocorre essa semana em Brasília. A perspectiva é que as obras sejam lançadas até novembro deste ano. Os valores - ainda não divulgados - já estariam garantidos. Essa transferência de atribuição é permitido a partir de um termo emitido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

“Vamos ver se conseguimos fazer os estudos [de impacto ambiental] até o fim deste ano”, diz o secretário de Meio Ambiente do Acre, Israel Milani. Se o processo fosse tocado pelo Ibama, poderia se levar até quatro anos. 

Como há uma terra indígena envolvida, os estudos também devem passar pela análise da Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão hoje dominado pelo setor ruralista e pelos evangélicos. Além do aval da Funai, a própria população indígena precisa ser favorável ou não à passagem do linhão dentro de suas terras.

O caso é semelhante ao que acontece na divisa do Amazonas com Roraima, por conta da construção do linhão entre Manaus e Boa Vista. Por haver a terra indígena dos Waimiri-Atroari, o licenciamento da obra enfrenta um impasse. Os indígenas são contra a construção das torres dentro de seu território com receio dos impactos. A terra também é cortada por uma rodovia federal, a BR-174.

Questionado sobre a terra dos Katukina no Juruá, o secretário de Meio Ambiente afirmou que será respeitada a “área de amortização”, tentando desviar as torres de transmissão de dentro do território tradicional.

“Ainda temos que fazer muitos estudos para ver a viabilidade e os impactos ambientais”, afirma Milani.

segunda-feira, 6 de maio de 2019

O buraco (verde) é mais embaixo


Após uma semana de passeios e de discussões sobre o futuro do planeta e os impactos das mudanças climáticas, a comitiva do agro é pop do governo Gladson Cameli voltou, digamos, ecologicamente correta. A turma que foi eleita com a promessa de transformar o Acre na maior potência global do agronegócio - nem que para isso colocasse toda a nossa floresta no chão - viu que o buraco é verde, e está um pouco mais embaixo.

Alguns dizem que a ida de Gladson Cameli para a reunião anual da Força-Tarefa dos Governadores para o Clima e Florestas (GCF), realizada na semana passada na cidade colombiana de Caquetá, fez o chefe do Palácio Rio Branco mudar seus conceitos sobre políticas ambientais, bem como a necessidade de ao menos manter, e não fragilizar as leis que protegem o meio ambiente. 

Para o grupo que hoje está no poder e que ficou 20 anos na oposição, todo este debate não passa de “coisa de petista e comunista”, e que por aqui ficou conhecida como “florestania”. Por conta disso, uma das suas primeiras ações foi tentar destruir toda a estrutura das políticas ambientais construída ao longo das últimas duas décadas.

Os discursos de Cameli na Colômbia mostram, aparentemente, um novo governador, agora consciente da necessidade de, sim, ter uma agenda ambiental forte que proteja nossa floresta não só para a sobrevivência local, mas também de toda a humanidade.

Contudo, o governador é conhecido por dançar conforme o ritmo. Tais declarações, óbvio, só foram feitas porque ele estava em sua primeira agenda internacional para tratar do tema, e o ambiente assim exigia. Se amanhã o progressista estiver reunido com os ruralistas na sede da Confederação Nacional da Agricultura, ele vai esquecer tudo o que disse na Colômbia e acusar o ambientalismo de atraso e entrave para o “desenvolvimento” do Acre. 

Portanto, as declarações elaboradas pela sua assessoria não são nada confortantes ante o histórico de sempre mudar de opinião. É o famoso, o que ele fala, não anote.

O GCF tornou ainda mais claro o que já sabíamos desde 1º de janeiro: o governo não tem uma política de desenvolvimento econômico clara para o Acre. Todos os projetos citados por Cameli foram iniciados na gestão passada. Ainda que tivessem sido mal planejadas e executadas, elas serviram de bases para uma proposta que conciliasse produção rural com sustentabilidade; o desafio, agora, é melhorá-las. 

Na Colômbia, Gladson Cameli percebeu que a junção produção/preservação não é apenas um clichê, mas uma necessidade. O Acre tem plenas condições de ser uma grande referência na produção agropecuária e, ao mesmo tempo, gerar riqueza para suas populações tradicionais a partir de uma exploração sustentável e racional dos recursos florestais.

Aliás, podemos ganhar muito dinheiro sem tirar uma única semente da floresta. Basta deixá-la lá, quietinha, estocando carbono, e alguns milhões de dólares vão jorrar para os cofres do Estado.

É de se esperar que, de fato, Gladson Cameli tenha aprendido e compreendido a importância do Acre ver a floresta não como empecilho, mas como nosso grande potencial. Se ele assim proceder e, simultaneamente, potencializar as áreas já desmatadas - com uma agricultura e pecuária que beneficiem pequeno, médio e grande produtor - o Acre tende a se consolidar como referência na conturbada relação crescimento/proteção ambiental.

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Um governo sem cacique

Detentor de uma agenda antiambiental e anti-indígena, o governo do Acre não vem dando a devida atenção à participação de lideranças indígenas do estado que também estão na reunião anual da Força-Tarefa dos Governadores para o Clima e Florestas (GCF), que ocorre desde o inícoi da semana na cidade de Caquetá, na Colômbia.

Duas lideranças representam o Acre no evento: Francisco Pyiãko, do povo Ashaninka, e Francisca Arara, dos Arara, ambos com suas terras localizadas no Vale do Juruá.. Os indígenas tem um grupo próprio dentro do GCF, que é o GTI (Grupo de Trabalho Indígena) que reúne os povos tradicionais dos estados membros da força-tarefa do clima.

Os representantes indígenas do Acre não integram a comitiva oficial do governo Gladson Cameli (Progressistas). Eles viajaram a convite da Comissão Pró-Índio (CPI), e durante o evento - que se encerra nesta sexta - não tiveram agendas oficiais com os membros do Palácio Rio Branco.

Entre os integrantes da comitiva de Cameli estão pessoas sem o mínimo alinhamento com a pauta ambiental ou indígena. Exemplo é o chefe da Casa Civil, Ribamar Trindade, autor do projeto de reforma administrativa que extinguiu o Instituto de Mudanças Climática (IMC), principal órgão regulamentador das políticas acreanas de captação e gerenciamento dos recursos para investir em atividades econômicas de baixo impacto ambiental.

Outra extinção da reforma foi a assessoria dos Povos Indígenas, principal elo de comunicação entre as comunidades e o governo acreano. Prestes a apresentar a reforma da reforma, o Palácio Rio Branco tende a recriar o IMC diante de sua força para a obtenção de recursos internacionais.

Mostrando falta de afinidade com a temática, o governo enviou como sua porta-voz para discursar durante a reunião dos povos indígenas do GCF, a primeira-dama, Ana Paula Cameli. A mulher do governador não é a melhor das referências para tratar da questão indígena, já que tem pouco conhecimento sobre o assunto, sem histórico de atuação em defesa das comunidades tradicionais do Acre.