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quinta-feira, 23 de março de 2023

poluição extrema

Puxadas pelo desmatamento, emissões brasileiras crescem duas vezes mais do que média global


Brasil falha no cumprimento da Política de Mudanças do Clima, mostra relatório. Emissões aumentaram 40% desde que país se comprometeu a reduzi-las

 

 

Queimadas na Amazônia são grandes emissoras de CO2 (Foto: Jardy Lopes)

As elevadas taxas de desmatamento da Floresta Amazônica, registradas principalmente durante os quatro anos de governo Jair Bolsonaro (PL), fizeram com que o Brasil aumentasse a sua participação global na emissão de gases do efeito estufa e, consequentemente, no aquecimento do planeta. Apenas em 2021, último ano em que os dados foram computados, o país emitiu 2,4 bilhões de toneladas brutas de gás carbônico equivalente (CO2e), um aumento de 12,2% em relação a 2020, quando foram lançados na atmosfera 2,1 bilhões de CO2e.


Os dados fazem parte do mais recente relatório Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), elaborado pelo Observatório do Clima, e divulgado nesta quinta-feira (23).  Este é o segundo pior resultado em quase 20 anos de aferição, ficando atrás apenas de 2003, quando foram lançados na atmosfera três bilhões de toneladas de CO2e. O crescimento da poluição produzida pelo Brasil em 2021 é duas vezes superior à média global estimada para aquele ano (5%). 

Dos 2,4 bilhões de toneladas de carbono emitidas, 1,19 bilhão têm como origem o desmatamento ocorrido em todos os biomas do país. Em comparação com 2020, a poluição oriunda da chamada mudança de uso da terra e florestas (MUT) cresceu 18,5%. A quantidade supera as emissões do Japão – uma das maiores potências industriais e poluidoras do mundo.  

Sozinha, a Amazônia respondeu por 77% das emissões brutas de gases do efeito estufa oriundas da MUT. Em 2021, não por acaso, o bioma registrou a pior taxa de desmatamento em 15 anos, conforme os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE): 13.038 km2. Em 2020, a área derrubada também já tinha sido elevada: 10.851 km2.

Somando as emissões por desmatamento e outras mudanças de uso da terra com as do setor agropecuário, o relatório aponta que, em 2021, a atividade agropecuária respondeu por 74% de toda a poluição climática brasileira. O aumento do rebanho bovino fez com que somente a agropecuária ficasse na segunda posição entre os maiores emissores de gases do efeito estufa: 601 milhões de toneladas de CO2e. 

Em terceiro lugar com mais contribuição está o setor de energia, com 435 milhões de toneladas de CO2e; um ano antes foram 387 milhões. Foi a maior alta observada desde 1973, quando o Brasil estava no auge de seu “milagre econômico” da ditadura militar (1964-1985).   


Leia reportagem completa em ((o)) eco

quarta-feira, 22 de março de 2023

à sombra do bolsonarismo

Mesmo excluídos do comando, bolsonaristas são maioria na Comissão de Meio Ambiente do Senado


Críticos da política de preservação ambiental como Márcio Bittar (União-AC) e Zequinha Marinho (PL-PA) são titulares no colegiado; como protesto, bloco de partidos aliados a Bolsonaro boicotaram votação 


Leila Barros e Fabiano Contarato, presidente e vice da CMA do Senado (Foto:Agência Senado)

Apesar de não terem conseguido a presidência da Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado Federal, os bolsonaristas se constituem como a principal força política dentro do colegiado, composto por 17 membros titulares. A ex-ministra da Agricultura do governo Bolsonaro, Tereza Cristina (PL-MS), era o nome favorito entre os aliados do ex-presidente para o comando da CMA. Contudo, a articulação foi rifada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o comando do colegiado acabou ficando nas mãos de Leila Barros (PDT-DF), com Fabiano Contarato (PT-ES) como vice.


Apesar da eleição de Leila ter sido considerada unânime, os senadores do bloco Vanguarda – composto por PL, PP, Republicanos e Novo – se abstiveram da votação. Os aliados do ex-presidente da República, aliás, ficaram de fora das presidências das comissões mais importantes, num gesto de retaliação de Pacheco por eles lançarem a candidatura de Rogério Marinho (PL-RN) para a presidência do Senado, colocando em risco a reeleição do senador mineiro. 

Rogério Marinho e Tereza Cristina, apesar de não terem alcançado os cargos de presidência pretendidos, conseguiram assentos titulares na CMA. Outro expoente bolsonarista com cadeira no colegiado é o senador Márcio Bittar (União-AC), rítico ferrenho da agenda de preservação ambiental. Na visão de Bittar, tal agenda estaria a serviço dos governos europeus e seria responsável por  empurrar a população da Amazônia para a pobreza.  O parlamentar é um dos principais articuladores do PL 6024, que desafeta áreas da Reserva Extrativista Chico Mendes e transforma o Parque Nacional da Serra do Divisor numa APA.

Outro aliado de carteirinha do ex-presidente na região Norte é Zequinha Marinho (PL), que em 2022 saiu derrotado na disputa para o governo paraense . Ano passado, a Agência Pública divulgou reportagem com documentos que mostravam a atuação do senador em defesa de grileiros, garimpeiros e madeireiros no Pará. Ainda de acordo com o relato, Marinho fez articulações para coibir os trabalhos de agentes do Ibama e de servidores da Funai. Assim como Bolsonaro, o parlamentar defende a mineração dentro de terras indígenas.  

Empossado pela primeira vez no Senado em fevereiro, Jaime Bagattoli (PL) fez sua campanha em Rondônia ancorado na imagem de Jair Bolsonaro, e em defesa do agronegócio. Rondônia é um dos maiores redutos do bolsonarismo do país. No segundo turno de 2022, o ex-presidente ficou com 70% dos votos válidos no estado. Bagattoli esteve na leva dos candidatos bolsonaristas ao Senado eleitos pela Amazônia Legal.  Neste grupo também está Wellington Fagundes (PL-MT), escolhido como suplente na CMA.   

 

A nova presidente

Natural de Taguatinga, a ex-jogadora de vôlei Leila foi eleita senadora pelo Distrito Federal em 2018. Em sua biografia, a parlamentar afirma que dedica o mandato às causas do esporte, da defesa dos direitos das mulheres, da educação, saúde, mobilidade, acessibilidade e desenvolvimento sustentável.

“Nós vamos debater o que necessariamente é importante para o Brasil crescer economicamente, sustentavelmente, e a questão do meio ambiente tem que ser, sim, prioridade […] nós não podemos abrir mão dessa pauta dentro da comissão”, afirmou ela durante o discurso de posse na presidência do CMA, no último dia 8 de março.

Já o vice-presidente, Fabiano Contarato, fez um discurso mais duro, apontando a herança anti ambiental do governo Bolsonaro. “Quando se fala em preservação ambiental, nós estamos falando dos povos indígenas que são vítimas de um verdadeiro genocídio. Estamos falando dos Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, que também estão sofrendo muito”, disse ele.

De acordo com o senador, no governo Bolsonaro foram autorizados o uso de mais 1.500 tipos de agrotóxicos pela agricultura brasileira. “Nós temos que fortalecer os órgãos de fiscalização, acabar com qualquer tipo de assédio moral aos funcionários do Ibama e ICMBio. Nós temos que fortalecer ainda mais a Funai”

Veja, na página do Senado, como fica a nova composição da Comissão de Meio Ambiente.

 

Reportagem produzida para ((o)) eco

terça-feira, 21 de março de 2023

cercados e pressionados

Pressionados por invasões, Karipuna agora são impactados por cheia do rio Jaci-Paraná


Para liderança indígena, construção das usinas do Madeira influenciam enchentes frequentes e intensas na região. Hidrelétricas são heranças dos governos Lula e Dilma Rousseff 

 

Aldeia Karipuna, atingida pela cheia do Jaci-Paraná (Foto:Cedidas)

Após passarem os últimos quatro anos ameaçados pelo aumento das invasões de seu território por grileiros e madeireiros, o povo Karipuna, de Rondônia, agora se vê afetado pelo transbordamento do rio Jaci-Paraná, deixando-os ainda mais em situação de vulnerabilidade. Apesar de ser um fenômeno comum nesta época do ano no sul da Amazônia, as enchentes passaram a acontecer com mais frequência e intensidade desde a construção das usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira. “Essa usina impacta a gente culturalmente, além do impacto social e ambiental. Sem falar que o nosso território vem sendo impactado, afeta o nosso dia a dia, as plantações que a gente tem. Com a água acaba se perdendo tudo”, diz a liderança André Karipuna, em conversa com ((o))eco via mensagem de aplicativo. 

“Nós do povo Karipuna estamos passando por uma situação muito difícil no momento. O rio Jaci subiu muito. Metade da aldeia foi para o fundo, as casas, metade foi para o fundo. Ainda temos os problemas com os grileiros, com os madeireiros, que também estão no território e são bastante. Então agora temos dois problemas muito graves”, afirma o líder indígena.

Herança dos governos petistas no Palácio do Planalto, as usinas do Madeira também podem ser apontadas como responsáveis pelo aumento dos casos de invasões dentro da Terra Indígena Karipuna – e da vizinha Reserva Extrativista (Resex) Jaci-Paraná, unidade de conservação estadual que há anos foi transformada em médias e grandes fazendas de gado.  

Com a explosão demográfica observada no entorno de Porto Velho durante as obras de construção de Jirau e Santo Antônio, entre o segundo mandato de Lula e o primeiro de Dilma Rousseff, muitos dos trabalhadores foram buscar lotes de terra dentro do território indígena e da unidade de conservação. A abertura de ramais (estradas de terra) facilitou o acesso dos invasores.  

Com o desmonte da política ambiental e indígena promovida pelo governo Jair Bolsonaro (PL), as pressões sobre o território Karipuna se intensificaram. No âmbito estadual, o governador Marcos Rocha (União) enviou para a Assembleia Legislativa o projeto de lei complementar (PLC 80/2020), aprovado em maio de 2021, que desafetou parte da Resex Jaci-Paraná, fator que serviu como outro incentivo à grilagem de terras públicas em Rondônia.

Com 153 mil hectares, a TI Karipuna se espalha pelos territórios de Porto Velho e Nova Mamoré. Ela é uma das últimas áreas de floresta em região fortemente cercada por fazendas de gado e soja, além da atividade madeireira. Restritos a uma população de pouco mais de 60 pessoas após quase terem sido exterminados no processo de “marcha para o oeste”, os Karipuna encontram dificuldades para conter os invasores.

Ano passado, o desmatamento dentro da TI Karipuna foi de 17,41 km². Ela foi a quarta TI mais desmatada na Amazônia Legal. Entre 2019 e 2022, a área de Floresta Amazônica derrubada no interior do território Karipuna foi de 43,28 km². Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). 

Com o transbordamento do Jaci-Paraná, a situação do povo é de ainda mais vulnerabilidade em sua segurança alimentar e acesso à água potável. A enchente acaba por destruir os roçados e as criações de pequenos animais, além de inutilizar as fontes de água para consumo. A aldeia fica localizada na margem esquerda do manancial. Do outro lado fica o que sobrou de floresta da Resex Jaci-Paraná.

O rio Jaci-Paraná é um dos principais afluentes do Madeira. A região onde os mananciais se encontram está bastante represada. Grandes áreas ficaram inundadas após a construção da usina hidrelétrica de Santo Antônio. Com as intensas chuvas, comuns neste período do ano, o Madeira também apresenta aumento em suas cotas de medição.  

Segundo dados do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), nesta segunda-feira (20), o rio Madeira apresentava a marca de 13,68m. Em comparação com a última sexta (17), houve aumento de 22 cm do nível do rio. Conforme o boletim, mesmo apresentando leve tendência de elevação, o Madeira ainda tem “cotas abaixo da média para esta época do ano”.

Em 2014, a aldeia Karipuna também ficou debaixo d’água com a chamada “Grande Cheia do Madeira”. Naquele ano, já com as usinas em funcionamento, o manancial atingiu um de seus níveis recordes: 19,74m em Porto Velho. Cidades localizadas ao longo do leito, incluindo a capital rondoniense, foram inundadas. O Acre ficou isolado do restante do país por duas semanas após a BR-364 ficar submersa.

Já naquela época, apontava-se a construção das usinas como responsáveis. Até o governo da Bolívia de Evo Morales culpou as barragens pela inundação de cidades e comunidades ribeirinhas no país vizinho. Tanto o governo Dilma quanto os consórcios que administram os complexos negaram a relação. 


Reportagem completa disponível em ((o)) eco


segunda-feira, 20 de março de 2023

Guerra do Potássio

MPF quer multa para mineradora que mantém placas em território indígena no Amazonas

 

Há 20 anos o povo Mura, de Autazes (AM), reivindica a demarcação de área ocupada desde o século 18. Mineradora canadense quer explorar mina de cloreto de potássio no local

 

Comunidade Urucurituba, em Autazes (AM), e a placa da mineradora. Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real

O Ministério Público Federal (MPF) voltou a acionar a Justiça para que a empresa Potássio do Brasil retire as suas placas de identificação de dentro do território reivindicado pelo povo Mura, no município de Autazes, no Amazonas. Apesar de já haver decisão judicial para que as sinalizações sejam retiradas de dentro da Terra Indígena Soares/Urucurituba, a mineradora vem desobedecendo a medida. O MPF quer o pagamento de R$ 100 mil por desobediência, mais R$ 50 mil por dia por não retirada das placas. 

De acordo com a denúncia do Ministério Público, a Potássio do Brasil tem recorrido a agentes da guarda municipal de Autazes para intimidar os indígenas que, por iniciativa própria, retiram as sinalizações. A empresa chegou a recorrer da decisão de primeira instância que determinou a retirada das placas, mas o Tribunal Regional Federal da 1o Região (TRF-1) manteve a sentença. 

Apesar de não estar oficialmente demarcada e reconhecida pela Fundação Nacional dos Povos Indígena (Funai), a TI Soares/Urucurituba é reivindicada pelos Mura desde 2003. Os Mura estão entre os povos indígenas da Amazônia mais impactados pelo processo de invasão territorial da região pelo “colonizador”.

Após quase duas décadas de espera, em 2018 os Mura fizeram a autodemarcação da área pleiteada. Em 2022, também a pedido do MPF/AM, a Justiça Federal determinou que a Funai iniciasse o processo de demarcação do território Mura.

A região é cobiçada pela atividade minerária por concentrar grande quantidade de potássio, a matéria-prima para a produção de fertilizantes. Desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro do ano passado, o fornecimento de fertilizantes passou a ser a principal preocupação do agronegócio brasileiro, já que o país europeu é um dos maiores exportadores do insumo.

De acordo com reportagem da Amazônia Real, a região concentra uma grande mina de cloreto de potássio de classe mundial. Com a escassez de fertilizantes provocada pela invasão russa à Ucrânia, o então governo Bolsonaro passou a pressionar para que a exploração de potássio em Autazes fosse acelerada. De olho neste potencial, a Potássio do Brasil vem adquirindo áreas historicamente ocupadas pelos Mura desde o século 18. A mineradora é ligada ao banco canadense Forbe & Manhattan.

Desde novembro de 2021, quando dezenas de dragas de garimpo ficaram amontoadas no rio Madeira, o município de Autazes tem chamado a atenção pela forte presença da mineração em seu território. Além da pressão do garimpo ilegal, a região é cobiçada pelas grandes mineradoras multinacionais, colocando em risco a preservação ambiental e a sobrevivência das populações tradicionais que nela vivem.

Em nota enviada à ((o))eco, a empresa esclarece que: “Sobre as acusações do Ministério Público Federal (MPF) divulgadas em release da instituição, nesta segunda-feira, 20/03, a Potássio do Brasil afirma que só irá se manifestar a respeito nos autos do processo junto à Justiça Federal do Amazonas e reitera seu dever de sempre cumprir com o estabelecido nas Leis brasileiras”. 


Reportagem produzida para ((o)) eco

sexta-feira, 17 de março de 2023

fora de ambiente

Defensor do garimpo, José Priante assume Comissão de Meio Ambiente da Câmara


Em seu 7º mandato de deputado, José Priante (MDB-PA) já teve entre doadores de campanha mineradoras como Vale e Imerys Brasil. Em 2022, pediu fim de operações de combate ao garimpo na TI Munduruku

 

 

Dep. Priante (MDB-PA), eleito presidente da CMA da Câmara (Foto: Agência Câmara)

Ocupando uma cadeira de deputado federal desde 1995, o advogado José Priante (MDB-PA) foi eleito, na quarta-feira,15, o novo presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados. Primo do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), Priante é visto no estado como político com bastante ligação com a atividade minerária e sem nenhum histórico de atuação em defesa da causa ambiental. Ele recebeu o voto de 13 colegas, contra duas abstenções.  


“Compreendo a responsabilidade, o momento que o país atravessa, o debate no que diz respeito à sustentabilidade, o momento de pensar o país para as próximas gerações. A necessidade de mediar os trabalhos numa comissão tão sensível, onde temos representantes, pela pluralidade da Casa, que pensam diferente. Mais do que um voto, procurar ser o mediador do debate”, disse Priante em seu discurso de posse. 

O parlamentar disse estar preparado para intermediar e garantir oportunidades a todas as forças políticas representadas na Comissão de Meio Ambiente.”Venho de um estado que é foco de observação mundial e nacional, que é um estado amazônico, que é o estado do Pará, com reservas ambientais imensas, com conflitos profundos lá das entranhas da Amazônia que precisam ser debatidos.”    


Assista à sessão de instalação da Comissão de Meio Ambiente


De acordo com reportagem do jornal “O Estado de S.Paulo”, de novembro de 2017, Priante recebeu quase meio milhão de reais de mineradoras com atuação no Pará para sua quinta campanha de reeleição para a Câmara, em 2014. Segundo a reportagem, o emedebista era alvo de inquérito sigiloso, em tramitação no Supremo Tribunal Federal, que investigava possíveis irregularidades no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) no Pará. Ao Estadão, Priante negou qualquer irregularidade.

As investigações começaram em 2015, a partir da deflagração da operação Grand Canyon, da Polícia Federal. Os investigadores detectaram possível esquema de cobrança de propina por servidores do DNPM no Pará, cujas indicações foram feitas pelo deputado. As propinas, segundo a PF, eram cobradas pelas emissões de autorização de títulos minerários no Pará.

Entre os doadores da campanha de Priante em 2014 está a Vale. A mineradora repassou R$50 mil. A Imerys Rio Capim Caulim S.A. doou mais R$ 100 mil.  Sediada em Barcarena, um dos municípios paraenses mais impactados pela mineração, a Imerys Brasil se apresenta como empresa que  “extrai e/ou beneficia os minérios de Carbonatos de Cálcio, Caulim e Perlita”.

O parlamentar paraense também já fez discursos em defesa do garimpo, criticando a atuação da Polícia Federal durante operação na Terra Indígena Munduruku, no começo do ano passado, e que resultou na destruição de maquinários dos garimpeiros.   

“Não estou defendendo o garimpo ilegal, a irregularidade, mas afirmo que garimpeiro não é bandido. É desinteligente destruir o equipamento. Não tem ambientalista que me justifique isso. É um desperdício destruir ativos. Eu sou a favor de que seja coibida a atividade irregular. Está se criando um clima de guerrilha”, afirmou ele à época.

Em outra frente, o agora presidente da Comissão de Meio Ambiente se reuniu com o então chefe da Casa Civil do governo Bolsonaro, Ciro Nogueira, para pedir o fim das operações de combate ao garimpo no território Munduruku.  


A influência de Helder Barbalho na escolha 

(continue lendo em ((o)) eco)

barreiras judiciais

Justiça é última barreira de leis e decretos que fragilizam a proteção ambiental na Amazônia Legal


Projetos aprovados por Assembleias Legislativas ou decretos de governadores entram em conflito com legislação nacional, e são anulados pelo Judiciário; classe política local segue alinhada ao bolsonarismo 



A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), do último dia 2 de março, de tornar nula a legislação aprovada pela Assembleia Legislativa de Rondônia (ALE-RO) que proibia a destruição ou inutilização de equipamentos em operações de combate aos crimes ambientais, expõe o leque de iniciativas semelhantes, aprovadas nos últimos quatro anos pelos parlamentos dos estados da Amazônia Legal. Lei com o mesmo teor foi sancionada em Roraima, cujo objetivo era proteger maquinários usados pelo garimpo, incluindo aeronaves.


Os dois casos são apenas um pequeno exemplo de força da agenda antiambiental comum nas Assembleias Legislativas da região. Parte das cadeiras são ocupadas por políticos ligados ou financiados pelo agronegócio, além daqueles que estão ideologicamente afinados com a principal corrente política nestes estados: o bolsonarismo. 

Entre 2019 e 2022, embalados pela política bolsonarista de “deixar a boiada passar”, deputados estaduais (ou por vezes o próprio poder Executivo) apresentaram projetos de lei para fragilizar as leis locais de proteção ambiental. As propostas mais comuns estão no sentido de reduzir o poder de fiscalização das agências, além de acabar ou diminuir o tamanho de unidades de conservação.

O caso mais recente aconteceu em fevereiro, quando a Assembleia Legislativa de Mato Grosso aprovou em primeiro turno uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC 12/2022) que praticamente inviabiliza a criação de novas áreas protegidas no estado. No caso de Rondônia, o governador Marcos Rocha (União) precisou apenas de uma canetada para revogar, às vésperas do segundo turno de 2022, a existência da Estação Ecológica Soldado da Borracha, localizada entre Porto Velho e Cujubim.

Os dois estados estão entre os maiores redutos do bolsonarismo no país, concentrando elevados índices de desmatamento e queimadas. A ofensiva contra o arcabouço legal de proteção do meio ambiente na Amazônia Legal se dá por meio dos instrumentos jurídicos mais convenientes.

Ainda em ato de ofício, o governador Marcos Rocha liberou o licenciamento do garimpo no rio Madeira, na região de Porto Velho. A atividade é bastante comum, sendo possível encontrar balsas de garimpo na região central da capital, aos olhos de qualquer um. Após recursos movidos pelo Ministério Público Estadual, o Tribunal de Justiça anulou partes do decreto.

Para conter os potenciais danos de tais medidas, recursos são impetrados junto ao Poder Judiciário para pedir as suas ilegalidades. As ações são movidas por organizações da sociedade civil, partidos políticos e os Ministérios Públicos em suas duas esferas: o Federal e o Estadual.  

A inconstitucionalidade da lei rondoniense, que vetava a destruição de maquinários, foi definida pelo ministro Gilmar Mendes, e seguida pela maioria do plenário do STF. A lei foi aprovada pela Assembleia de Rondônia em dezembro de 2021. Ela tem como autor o deputado Alex Redano (Republicanos), um dos principais entusiastas da agenda antiambiental na Casa. Na ocasião, ele ocupava a presidência da ALE-RO.

A lei de Roraima que também proibia órgãos do Estado de destruírem equipamentos foi aprovada pela Assembleia Legislativa em maio de 2022. O Ministério Público Federal ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) junto ao STF para anular a lei. O processo ainda está em análise pela Corte.  

Em janeiro de 2021, o governador de Roraima, Antônio Denarium (PP), enviou para a Assembleia Legislativa projeto que implementou o licenciamento para a atividade de lavra garimpeira. Aprovada pelo Parlamento e sancionada por Denarium, a Lei 1.351/2021 estabelecia critérios menos rígidos para a emissão das licenças ambientais, permitindo até mesmo o uso do mercúrio.

A proposta não especificava para quais áreas haveria a concessão de exploração, o que geraria conflitos com a legislação federal. A partir de ação movida pela Rede, o ministro Alexandre de Moraes de forma liminar e monocrática anulou a validade da legislação.

O entendimento básico das ações movidas – e acatado na maioria das vezes pela Justiça – é o de que essas leis estaduais são inconstitucionais por se confrontarem com a legislação federal. Mesmo tendo consciência de que suas medidas correm o risco de serem anuladas pelo Judiciário, deputados e governadores bolsonaristas insistem em tais práticas – muitas das vezes apenas como aceno às suas bases eleitorais.

Se essas leis acabam por não ter efeito constitucional, na prática sua aplicação – mesmo que momentânea – representa graves danos à proteção ao meio ambiente. Incentivados pela sensação de amparo legal, muitos praticam crimes ambientais, em especial a invasão de áreas públicas, incluindo unidades de conservação e terras indígenas. Até os tribunais declararem a inconstitucionalidade, o estrago na floresta já está feito. 

 

Reportagem produzida para ((o)) eco


quinta-feira, 16 de março de 2023

o conflito do carbono

Interesse por mercado de carbono ressuscita conflitos agrários na Amazônia


Em Xapuri (AC) extrativistas são intimados a deixar área cobiçada por fazendeiro para investir em crédito de carbono. Região protagonizou "empates" liderados por Chico Mendes na década de 1980 

 


As áreas de floresta que foram palco de conflitos por terra na Amazônia, entre as décadas de 1970 e 1980, resultando na morte de lideranças como Wilson Pinheiro e Chico Mendes, voltam a protagonizar disputas entre os grandes donos de fazendas com extrativistas e pequenos agricultores. Um dos símbolos da resistência dos seringueiros acreanos pelo direito de permanecer em suas “colocações” durante a política de ocupação da região pela ditadura militar, a Fazenda Bordon, agora Fazenda Soberana, de 14 mil hectares, é outra vez o centro dessa disputa. 

Se há 40 anos os fazendeiros vindos do Sul e Sudeste do país – alcunhados pelos extrativistas de “paulistas” – chegavam à Amazônia com a missão de derrubar a floresta para transformá-la em pasto para o gado, em 2023 os conflitos com os moradores tradicionais acontecem com uma nova e inusitada justificativa: a preservação ambiental.

De olho em ampliar e diversificar seus lucros, fazendeiros do Acre investem em projetos de mercado de carbono. Para isso, destinam as áreas remanescentes de florestas dentro das propriedades, a reserva legal, para o chamado sequestro de carbono. Outra atividade explorada por eles com intensidade nos últimos anos é a extração de madeira por meio de manejo sustentável. Na Amazônia Legal, as propriedades rurais devem preservar 80% da cobertura florestal em suas áreas.

“Com essa expectativa de mercado de carbono está se gerando muitos conflitos agrários. Só esse ano já participamos de dois movimentos que tiram o sono dos trabalhadores. Um no município de Feijó e agora em Xapuri. Isso aponta para que seja motivo para muitos conflitos agrários daqui pra frente”, diz Antônio Sergione Freitas, presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Acre (Fetacre). 

Ao se destinar a reserva legal da Fazenda Soberana para a venda de carbono, o fazendeiro Júlio César Moraes Nantes decidiu entrar com mandados de reintegração de posse contra as famílias de seringueiros que vivem na região ao menos desde a década de 1970. Elas afirmam viver na área que formava o antigo Seringal Nazaré muito antes da compra da propriedade pelo Grupo Bordon.

Em nota enviada à reportagem de ((o))eco, o advogado Matheus Silva Novais, que representa Júlio César Moraes Nantes, dono da Fazenda Soberana, afirma que essas famílias estão na área de reserva legal da propriedade, e que todos os antigos posseiros que ocupavam a outrora Fazenda Bordon foram devidamente indenizados. (Veja íntegra da defesa abaixo)

O seringal Nazaré ficou de fora dos limites da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes. Criada após o assassinato do líder seringueiro para por fim aos conflitos por terra na região sudeste do Acre, e assegurar a proteção de quase um milhão de hectares de Floresta Amazônica, a unidade de conservação é vizinha às áreas reivindicadas pelo dono da Fazenda Soberana. Pelo menos 30 famílias de extrativistas e seus descendentes correm o risco de serem expulsas.

Entre eles está o seringueiro Antônio Cândido da Silva, de 70 anos. Em 1986, relembra ele, participou de um dos “empates”, junto com Chico Mendes, na Fazenda Bordon. Os “empates” eram a forma encontrada por seringueiros e seringueiras para resistir à transformação da floresta em pasto, e, consequentemente, serem expulsos. De braços entrelaçados, colocavam-se à frente de policiais e capatazes das fazendas para “empatar” o avanço do desmatamento.  

Após ter resistido a tantas pressões, Antônio Cândido, um extrativista de fala mansa e estatura baixa, agora se vê às voltas de ser obrigado a abandonar a colocação onde vive no Seringal Nazaré desde os anos 1970 por ordem da Justiça. 

O filho, Sebastião Silva, o Tião, já foi notificado no último dia 3 de março. Ele ganhou do pai uma área de 50 hectares para morar com a mulher e os filhos. A família ainda trabalha com a extração do látex e a coleta de castanha para sobreviver, além do roçado e a criação de animais.

“Naquele empate de 86 tava o Chico, tava a Marina Silva, tava o professor Mauro [Almeida] da Universidade de São Paulo, tava a Globo. A gente lutou por um mês e conseguimos o resultado que a gente queria. Eu estava lutando pela minha colocação, e na verdade não era só eu, era toda essa familiarada que morava lá naquela área”, diz Antônio Cândido.

“Tudo o que existe dentro daquela área lá foi através dessa luta que a gente fez em defesa do seringueiro, contra o desmatamento feito pela Bordon”, completa. “O juiz [Luis Gustavo Alcalde Pinto, da Vara Cível de Xapuri] deu prazo de cinco dias para o meu filho sair da área que eu dei para ele. Como pode isso acontecer dentro de uma área que é minha?”.

A falta de regularização fundiária do Seringal Nazaré é o que faz a Fazenda Soberana reivindicar a posse como reserva legal. Ao ficar de fora da Resex Chico Mendes, o antigo seringal não foi transformado num projeto de assentamento extrativista (PAE) pelo Incra, sendo essa a destinação da maioria dos seringais no entorno, incluindo o Cachoeira – outro palco dos “empates”.

Na região, o Seringal Nazaré ficou conhecido como “área branca” por estar fora dos limites da Resex Chico Mendes, e não ter passado por regularização fundiária. Com isso, as famílias de extrativistas e seus descendentes são chamados de “posseiros”, deixando-os em situação de insegurança jurídica.       

É o caso de Eldo Lucas de Moraes, de 35 anos, que mesmo já tendo sido funcionário de carteira assinada da Fazenda Soberana, também já foi intimado a deixar a área onde mora. Ele afirma não estar mais em sua casa com medo de ser preso pela polícia. “Eu não tenho para onde ir. Eu nasci e me criei aqui. Meus pais estão velhinhos e precisam de mim por perto com ajuda, levar eles pra cidade”, diz.

E foi do pai, um dos antigos seringueiros de Xapuri, que ele recebeu a área para viver com a família. A prática é bastante comum na região. Com as “colocações” (fatias dos seringais) divididas por estradas de seringas (com tamanho médio de 100 hectares), os extrativistas mais velhos acabam por fracionar áreas com filhos e filhas. Tudo feito de palavra, sem documentos, sendo uma herança de família.

Acusados pelo fazendeiro de praticarem danos ambientais que prejudicam seu projeto de mercado de carbono, os seringueiros de Xapuri e descendentes voltam a conviver com o medo de serem expulsos de terras onde construíram suas histórias.  


“Novos empates” 

(leia reportagem completa em ((o)) eco)

segunda-feira, 6 de março de 2023

retirada

Defensores de PL da desafetação são notificados a deixar Resex Chico Mendes


ICMBio começou a notificar moradores autuados por uma série de crimes ambientais; com aprovação do PL 6024, eles tentavam ficar livres de processos a que respondem na Justiça, como agora o de desocupação 

 

Fotografia de Alexandre Cruz Noronha

Os principais idealizadores e patrocinadores políticos do projeto de lei que visa desafetar áreas da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, o PL 6024, aos poucos vão tendo que sair de dentro da unidade de conservação por ordem da Justiça. Autuados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ao longo dos últimos anos por uma série de crimes ambientais, eles já recorreram (e perderam) em todas as instâncias possíveis no Judiciário Federal.


No fim de fevereiro, o ICMBio passou a fazer as notificações para que os autuados desocupem as áreas dentro da reserva extrativista, dando a eles os prazos estabelecidos pela Justiça. Entre os notificados está o principal entusiasta do PL 6024, o pecuarista Rodrigo Oliveira Santos. Desde 2019, ele se movimenta como o principal articulador político pela aprovação do projeto de lei, apresentado na Câmara, em dezembro daquele ano, pela ex-deputada bolsonarista Mara Rocha (MDB). 

Para assegurar certa legitimidade da proposta entre os moradores da unidade de conservação, Rodrigo organizou uma série de audiências para coletar assinaturas. Os encontros aconteciam tanto no interior dos seringais da Resex Chico Mendes, como nas câmaras municipais das cidades acreanas localizadas dentro dos limites da UC.

Ao tentar fazer a notificação de Rodrigo Santos, no seringal Santa Fé, município de Epitaciolândia, os agentes do ICMBio não o encontraram. No lugar estava outra família, que afirma ter comprado lotes na área embargada. O caso expõe outro grave problema dentro da Resex Chico Mendes: a comercialização de pedaços de terra pelos próprios moradores da unidade.

A problemática se intensificou, justamente, a partir da apresentação do PL 6024. A promessa de que as vendas seriam legalizadas a partir da aprovação do projeto criou uma verdadeira indústria da grilagem na região. Produtores rurais de Rondônia passaram a ser os principais compradores de lotes dentro da Resex Chico Mendes, cuja prática é ilegal.

A chegada de novos moradores sem o perfil extrativista é apontada como um dos fatores para o aumento dos impactos ambientais no interior da reserva. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre 2019 e 2022, a Resex Chico Mendes foi a quinta unidade de conservação mais desmatada na Amazônia Legal: 305 km2.

A redução, e em alguns casos até o fim das fiscalizações pelo ICMBio por pressões políticas, também contribuiu para o agravamento da situação de uma das unidades de conservação da Amazônia mais pressionadas pelo agronegócio, localizada nas bordas do arco do desmatamento.

Rodrigo Santos foi um dos organizadores de reunião realizada em novembro de 2019, com o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, cujo objetivo era pedir o fim das fiscalizações dentro da reserva.  Mal-feito e mal-redigido, o PL 6024 prevê a desafetação de 22 mil hectares dentro da Resex Chico Mendes, cujo tamanho é de 970 mil hectares. Desde sua criação, em 1990, ela já perdeu quase 10% de cobertura florestal.  

O PL não especifica uma área contínua que deixaria de ser resex. O projeto apresenta coordenadas geográficas em diferentes pontos, onde se concentra, exatamente, as regiões mais desmatadas, onde os antigos seringais foram transformados em fazenda para o gado.

Com a eventual aprovação da matéria pelo Congresso, os infratores ambientais veriam suas propriedades excluídas dos limites da Resex Chico Mendes, o que os levaria a deixar de responder aos processos na Justiça, incluindo o de desocupação das áreas embargadas.

Conforme ((o)) eco apurou, além de Rodrigo Santos, quem também já teve ação concluída é Fátima Sarkis, outra grande defensora do PL 6024. Os demais ainda aguardam o resultado dos recursos impetrados. 


Reportagem original publicada em ((o)) eco