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quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Ano novo, dívida velha

Governo regulamenta refinanciamento de dívidas de estados e municípios 

Agência Brasil

O governo federal regulamentou as condições nos contratos de refinanciamento de dívidas dos estados e municípios com a União. O decreto foi publicado em edição extraordinária do Diário Oficial da União de ontem (29) e regulamenta a Lei Complementar 148/2014, que alterou os critérios de indexação aplicáveis aos contratos.

A regulamentação da lei foi uma das reivindicações apresentadas por um grupo de governadores ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, na última segunda-feira (28). Segundo o Ministério da Fazenda, a aplicação da lei impactará mais de 200 contratos de refinanciamento de dívidas celebrados entre estados e municípios com a União. Deverá permitir aos devedores a redução em seus pagamentos futuros para a União. O ministério ressalta que a lei não provoca impactos para a dívida pública e não afeta o resultado primário da União e de estados e municípios.

Em junho deste ano, o Congresso Nacional aprovou a prorrogação para 31 de janeiro de 2016 da aplicação do novo indexador para as dívidas de estados e municípios, mas o texto precisava de regulamentação. O texto determina que a partir dessa data, o governo deverá corrigir os débitos pela taxa Selic ou pelo IPCA – o que for menor – mais 4% ao ano. A lei concede desconto sobre os saldos devedores dos contratos de refinanciamento de dívidas dos estados e dos municípios.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Um fim quase trágico para Jorge Viana?

Ainda no primeiro trimestre de 2015, o senador Jorge Viana (PT-AC) ganhou por duas semanas a atenção quase exclusiva da imprensa acreana quando, ao reunir um grupo de jornalistas para tomar café em um tradicional mercado de Rio Branco, decidiu lava a roupa suja fora de casa. Já naqueles meses a crise política dava sinais de que iria se intensificar diante do desenrolar da Operação Lava Jato.

Ileso até então diante das denúncias de corrupção na estrutura da Petrobras, Jorge Viana sobrevivia como uma das principais referências dentro do PT para tocar em questões espinhosas para os petistas, sobretudo a ética na política.

Ao contrário de seu irmão, o governador do Acre, Tião Viana (PT), Jorge não figurava na lista do Janot, como ficou conhecida a denúncia de políticos suspeitos de corrupção aos tribunais superiores feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

(Outro político do Acre no “listão” está o senador Gladson Cameli, do PP)

O PT teve 2015 de inferno com a operação Lava Jato; os petistas viram suas principais lideranças voltando para a cadeia, entre eles o idolatrado José Dirceu. Outro enviado para a carceragem da Polícia Federal no Paraná era o tesoureiro João Vaccari Neto. Quem também figurava na lista do Janot era o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE).

Enquanto isso, Jorge Viana surfava na onda da credibilidade política diante dos jornalistas que cobrem o Congresso Nacional. Era sempre referência para entrevistas cujo tom sempre foi de puxão de orelhas nos companheiros petistas envolvidos com corrupção. Mas o ano acabou trágico para o parlamentar.

Não que ele tenha sido flagrado com a boca na botija do petróleo. Contudo, a postura de, em análise no Senado, votar pela soltura de seu colega Delcídio do Amaral (MS) levou toda sua retórica de ética na política para o fundo do poço; Viana tomou uma atitude ousada junto com a bancada petista no Senado, pois o próprio PT já tinha abandonado o ex-líder do Planalto no Senado, deixando-o aos leões.

Após ter sua imagem explorada nas redes sociais como um dos parlamentares que votou pela soltura de um colega flagrado tentando atrapalhar as investigações da Lava Jato, Jorge Viana mergulhou em seu inferno astral como os demais petistas. O senador acabou por perder todo o respaldo no debate das boas práticas na política brasileira, sendo deixado de lado pela mídia e visto com desconfiança pelos eleitores.

Este foi o custo político pago pelo senador ao pertencer a um partido acusado de patrocinar e se beneficiar diretamente do maior escândalo de corrupção de nossa política. Ou Jorge Viana se dissocia da imagem do PT, ou a pecha de corrupção que aparenta estar indissociável do PT trará sérios danos a um político que, aparentemente, ainda tem um pouco de diferente de tudo isso que está aí.

Afinal, não basta ser honesto, é preciso parecer ser honesto.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Entraves na paz

Acordo de paz na Colômbia não será assinado em março, diz negociador das Farc


Por Agência Brasil 

O acordo de paz entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) não vai ser assinado em março, como foi anunciado pelas duas partes, disse nesse domingo (20) um negociador dos guerrilheiros em entrevista na televisão.

“Em nome da verdade, devemos ser claros e dizer que em 23 de março não vai ser assinado o acordo final”, afirmou Jesus Santrich ao canal Noticias Uno.

Santrich, cujo nome verdadeiro é Seusis Pausivas Hernández, faz parte da delegação das Farc nas negociações com o governo, iniciadas em Havana (Cuba) em 2012.

No dia 23 de setembro, o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, prometeu assinar um tratado de paz no prazo de seis meses com o líder das Farc, Timoleon Jimenez, conhecido por Timochenko.

No início de novembro, no entanto, a guerrilha considerou que a assinatura poderia ser atrasada devido a divergências.

As Farc, a mais antiga guerrilha da Colômbia, formada em 1964 depois de uma revolta de camponeses, ainda conta com cerca de 7 mil combatentes, segundo as autoridades.

O grupo respeita um cessar-fogo unilateral desde 20 de julho, enquanto é aguardada uma trégua bilateral prometida pelo presidente Juan Manuel Santos até este fim de ano.

Os mais de 50 anos de conflito deixaram pelo menos 220 mil mortos, 6 milhões de deslocados e milhares de desaparecidos.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Eduardo Ribeiro, Maju e o Amazonas


Eduardo Ribeiro, filho de escrava negra do Maranhão
Em uma caminhada absorta pela rua José Clemente, no centro de Manaus, uma charrete do século 19 estacionada na garagem de uma casa antiga me chama a atenção. Paro, dou meia-volta e descubro que se trata de um museu, especificamente a casa de Eduardo Ribeiro, o primeir o governador do Amazonas. Decido entrar e sou recepcionado por um jovem guia, estudante de História.

Lá, sou apresentado ao modo de vida de um intelectual que fez toda a diferença para a construção do que é hoje o Amazonas e sua capital.  O mais interessante nisso tudo é a descoberta de que o primeiro governador do Estado, um visionário, era mulato –filho de uma mãe negra escrava e um pai branco. Ele nasceu em 1862 no Maranhão.

Isso em uma sociedade que se apresentava extremamente preconceituosa e racista; traços estes que ainda são perceptíveis em parte dos amazonenses.

Veja: Amazonas é um dos Estados mais racistas, afirma pesquisadora

O caso mais recente a provar isso foi o ataque racista realizado contra a jornalista Maria Júlia Coutinho, que teve Manaus como uma das principais bases deste grupo insano.

Leia: Grupo virtual criado no AM é suspeito de racismo contra jornalista Maju

Soa paradoxo um Estado cuja formação histórica só foi possível graças às suas raízes indígenas, e depois com a chegada dos escravos negros e de Nordestinos que para cá vieram para produzir borracha nos seringais. E foi esta mesma borracha a responsável por importar para Manaus um estilo de vida europeu, sobretudo parisiense.

A riqueza e a fortuna geradas pela extração do látex fizeram a Amazônia viver seu apogeu no fim do século 19 e início do 20. Os barões da borracha faziam questão de ostentar uma vida luxuosa e viver nos mesmos moldes da burguesia francesa. Isso se expressava nas roupas, nas construções e até nos hábitos diários. Talvez o maior símbolo desta imponência seja o belo Teatro Amazonas –obra que estava empacada, mas concluída por Eduardo Ribeiro, responsável pelos últimos retoques no projeto arquitetônico.

E o grande responsável por transformar Manaus na “Paris dos Trópicos” foi o mulato Eduardo Ribeiro, que concebeu o projeto urbanístico da cidade como cópia da capital da França. Ser um apaixonado pela cultura francesa e um engenheiro de visão, não livrou Ribeiro de ser alvo dos preconceitos da sociedade amazonense da época, que não admitia o fato de ser governada por um homem de origem negra.

Tanto assim, que Eduardo Ribeiro é retratado em seus quadros com os aspectos de um homem
A sala de jantar do casarão de Eduardo Ribeiro
branco. Nas pinturas sua pele ganha tons mais claros, e em uma delas suas bochechas ficaram rosadas. Eduardo Ribeiro foi morto em 1900, em circunstâncias até hoje não bem esclarecidas. Sofrendo com a esquizofrenia, foi atormentado pela loucura, e tinha a camisa de força como uma de suas últimas vestimentas.

A conclusão deste minha excelente visita ao casarão de Eduardo Ribeiro é a de que o preconceito e o racismo são meros frutos da ignorância em seu estado mais puro –estejam eles em qualquer posição geográfica. Tentar compreendê-los em um Estado de tão variadíssima formação social e cultural  chega a ser um desafio que a mente humana em seu mais elevado grau jamais compreenderá.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Um bar, um continente


Foto: Fabio Pontes
Tomando uma cerveja em um bar no aconchegante centro antigo de Manaus, tive a alegria de dividir minha mesa (afinal, todas as poucas mesas já estavam ocupadas) com o venezuelano Júlio Valdez, de 42 anos. Ele estava acompanhado de seu cicerone brasileiro Adalberto Souza, de 65 anos. Ali, naquela mesa, estavam três migrantes latino-americanos.

Com sua barba e cabelo brancos, Adalberto é um baiano que chegou a Manaus na década de 1970, quando a cidade tinha 800 mil habitantes, recorda ele. Hoje com dois milhões de pessoas, Manaus é conhecida como a metrópole da Amazônia, ou a metrópole da floresta.

Antes de desembarcar em Manaus, Adalberto –como a grande maioria dos Nordestinos – tentou a vida na grande São Paulo. Por lá ficou um ano e decidiu vir para o Norte. “Sou manauara desde 1972”, responde-me quando pergunto de onde era. Já o venezuelano Júlio ainda não desembarcou no Brasil para tentar a vida de vez –está apenas sondando.

Antes de Manaus passou por Boa Vista, a capital de Roraima. Disse ter ficado impressionado com a organização e a limpeza da cidade, ante o aspecto sujo do centro velho de Manaus, algo bastante típico das grandes cidades brasileiras. Outro migrante era eu, que desembarcou na capital amazonense em busca de novas perspectivas profissionais, deixando Rio Branco por um tempo.

Na mesa, o assunto não poderia ser outro: politica e economia. Afinal, Brasil e Venezuela passam por crises semelhantes nestes dois campos. O Brasil está perto de ver sua presidente deposta pelo Congresso Nacional; Nicolas Maduro também pode seguir o mesmo destino já que a oposição saiu com vitória esmagadora para a Assembleia Nacional, o que também pode desencadear num eventual impeachment do sucessor de Hugo Chávez.

Na economia a inflação corrói o poder de compra dos brasileiros e dos venezuelanos. Para eles a situação é bem mais crítica. “Falta de tudo em nosso país, desde o papel higiênico ao feijão”, comenta ele. Ao falar do feijão, seus olhos brilham ao se lembrar de estar comendo “frijoles” nos dias que tem passado no Brasil.

“Aqui vocês não passam por isso. Há de tudo no mercado, podem comprar o que quiser.” O ápice da conversa se deu quando Júlio Valdez me deu de presente duas notas da moeda de seu país, uma de cinquenta e outra de vinte, totalizando setenta bolívares. Fiquei impressionado com aquela atitude.

O espanto maior veio quando, usando da calculadora de seu celular, converteu cinquenta bolívares para o real: R$ 0,85. Não errei, meu caro leitor. Com oitenta e cinco centavos de real você terá uma nota de cinquenta bolívares. Depois entendi a razão de ele ter me dado aquele dinheiro com total desprendimento: aquelas notas simplesmente não valem nada.

Pelas cidades da Venezuela, é comum os cidadãos andaram com bolos e mais bolos de cédulas de bolívares. “Nossa situação está bem mais crítica do que em Cuba”, diz. Pergunto como está a vida dos mais pobres por lá: “Pior do que 1998”, ano da chegada de Chávez ao poder. Casado e pai de uma filha, Júlio Valdez pretende voltar ao Brasil em fevereiro –talvez agora para ficar de vez e tentar a vida.

Jamais poderia imaginar que sentar naquele bar central de Manaus, com as bandeiras de Portugal e do Vasco ao fundo, poderia render uma conversa tão proveitosa. E a conclusão que tirei é a seguinte: somos todos latino-americanos e enfrentamos os mesmos problemas. O atual momento do Brasil, os resultados das urnas na Venezuela e na Argentina revelam que mudanças estão a caminho.

As sociedades latino-americanas demonstram estar cansadas do populismo “bolivariano”; a esquerda teve sua chance, demonstrou não ter aproveitado. E tudo indica que o “capitalismo selvagem” voltará com tudo.

Viva Simón Bolívar, o libertador da América

domingo, 13 de dezembro de 2015

Uma "virada" americana?

Após a assinatura do acordo sobre a redução da emissão de gases do efeito estufa no último sábado (12) em Paris, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, disse que o compromisso firmado pelos países representa uma “virada” na luta para minimizar os efeitos das mudanças climáticas no planeta.

“O problema não está resolvido por causa do Acordo de Paris, mas agora foi definido um quadro objetivo sobre o que o mundo precisa fazer para resolver a crise climática”, disse Obama em pronunciamento na Casa Branca. Segundo ele, o acordo define o mecanismo e a “arquitetura” para que os países possam lidar com o problema de forma mais eficaz.

O presidente norte-americano definiu o acordo como “ambicioso e imperfeito”, mas disse que a assinatura mostrou que há esperança quando o mundo se une. O acordo vinculativo foi assinado por 195 países. “Hoje podemos estar mais seguros de que o planeta vai estar em melhor forma para a nova geração”, destacou.

Nos meses que antecederam a assinatura do acordo, Obama anunciou várias medidas internas, como a meta de redução em 32% da emissão de gases das usinas termoelétricas dos Estados Unidos até 2030. O tema encontra resistência nos setores empresarial e agrícola, além da oposição da bancada republicana, que hoje compõe a maioria do Congresso norte-americano.

Os Estados Unidos ocupam o primeiro lugar no mundo na emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.

Veja pronunciamento de Obama sobre o Acordo de Paris 






Agência Brasil

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Capital verde

 Brasil propõe criar novo mercado de carbono

Observatório do Clima

Brasil e a União Europeia propuseram nesta terça-feira às Nações Unidas a criação de um novo mecanismo de mercado para emissões de carbono. Pela proposta, países em desenvolvimento, governos locais e até mesmo empresas e associações poderiam transacionar direitos de poluição e descontá-los de suas metas de redução.

A proposta significa que o Brasil poderia eventualmente comprar créditos de carbono gerados por países onde fosse mais barato reduzir emissões, desde que não houvesse dupla contagem desses créditos. Esses papéis poderiam ajudar no cumprimento da INDC, a meta nacional proposta no âmbito do novo acordo do clima.

A ideia, nas palavras de um diplomata, é que o novo mecanismo possa funcionar como uma “cenoura”: países em desenvolvimento que queiram ter acesso a esses créditos para cumprir as próprias INDCs precisariam adotar metas de corte de emissões absolutas e válidas para toda a economia. Estaria criado, portanto, um incentivo positivo para resolver um dos grandes nós do Acordo de Paris, a chamada diferenciação com progressão.

Mas vamos começar do começo: a Convenção do Clima, de 1992, dividiu os países em desenvolvidos (o chamado Anexo 1) e em desenvolvimento. No protocolo de Kyoto, primeira tentativa de implementar a convenção, os países desenvolvidos receberam metas absolutas de corte de emissões e obrigação de financiar os pobres.

Para facilitar o comprimento de suas metas, os ricos ganharam acesso a três mecanismos de mercado, ou de “flexibilização”: o comércio de emissões (entre países desenvolvidos), a implementação conjunta (projetos de redução de emissões bancados por países desenvolvidos em nações do ex-bloco socialista) e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, ou MDL (projetos de redução de emissões em países em desenvolvimento).

Como os países em desenvolvimento não tinham metas a cumprir por Kyoto, eles só podiam participar dos mercados de carbono via MDL. O abandono do protocolo pelos EUA, porém, frustrou as expectativas de quem esperava ganhar muito dinheiro com o MDL para bancar projetos de energia limpa e desenvolvimento sustentável – já que o maior comprador potencial de créditos estava fora dele. No final, o mecanismo tornou-se uma parcela muito pequena das reduções de emissões, e o tal desenvolvimento limpo nunca aconteceu: ao contrário, os países em desenvolvimento, em especial a China, maior de todos os vendedores de créditos de MDL, aumentaram loucamente suas emissões. Hoje respondem por 60% dos gases-estufa lançados anualmente na atmosfera.

Corta para 2014. Os países negociam os termos do acordo do clima que deverá ser fechado nas próximas 72 horas em Paris. Nos 21 anos desde a entrada em vigor da Convenção do Clima, o mundo mudou. Alguns países em desenvolvimento estão, na prática, entre as nações mais ricas do mundo. Outros alcançaram a condição de países desenvolvidos, como a Coreia do Sul e Cingapura.

O novo acordo do clima, pela primeira vez, trará metas para todos os países do mundo. As nações desenvolvidas insistem em borrar a diferenciação existente entre ricos e pobres, argumentando, com razão, que essa história de anexos de Kyoto reflete um mundo que não existe mais. As nações em desenvolvimento contra-argumentam, também com razão, que a responsabilidade pela mudança climática observada hoje é dos países ricos. Está criado o impasse que se arrasta até as horas finais da conferência do clima de Paris.

Na ocasião, porém, o Brasil fez uma proposta para destravar a diferenciação. O país propôs um mecanismo de diferenciação não por anexos, mas por círculos concêntricos. Imagine rodas, uma dentro da outra. Na roda menor, no centro, estariam os países do atual Anexo 1, com metas absolutas de corte de emissões para toda a sua economia. Num círculo intermediário, os países emergentes, como o próprio Brasil e a China, que teriam metas relativas – corte em relação a uma trajetória futura ou redução na intensidade de carbono. No círculo externo, os países menos desenvolvidos, com contribuições menos rígidas, para um setor ou outro da economia. Com o tempo, todos os países deveriam migrar para o círculo central. Este é o conceito de “progressão”, que guarda uma das chaves para destravar o acordo de Paris e que está sendo negociado enquanto você lê este texto pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e seu colega de Cingapura, Vivian Ramakrishnan.

A progressão traz um problema, porém: em que momento um país deixa uma posição do círculo intermediário para o central? Não é possível forçar um país de renda média a migrar para metas absolutas. Mas tampouco é possível que cada país faça essa transição quando bem entender, porque vários poderão não fazê-la nunca. Para ficar em um exemplo, a Coreia do Sul, um país altamente desenvolvido, ainda se aproveita de seu status de país em desenvolvimento sob a Convenção: apresentou uma meta relativa de corte de emissões em sua INDC.

O mecanismo de mercado proposto pelo Brasil e pela UE no acordo de Paris traz um gatilho voluntário para essa transição: se você é um país emergente, pode encontrar um incentivo para adotar metas absolutas e economizar dinheiro comprando créditos gerados por gente mais pobre que você, onde cortar emissões seja mais barato.

A proposta pede que a primeira reunião das partes do Acordo de Paris, que deve acontecer em Marrakesh em 2016, lance um processo para criar esse mecanismo de mercado.

Além de resolver o impasse da progressão, brasileiros e europeus acham que o novo mecanismo também possa servir para atacar dois setores altamente poluentes e que estão até aqui descobertos pelo acordo do clima: a aviação e o transporte marítimo internacional.

As emissões desses dois setores são “filhas sem pai”: nenhum país as assume, não há metodologia acordada para atribuí-las a ninguém, países emergentes e os EUA se recusam a limitá-las e as organizações que deveriam cuidar delas, a Oaci (Organização Internacional de Aviação Civil) e a OMM (Organização Marítima Mundial) não são exatamente colaborativas para adotar voluntariamente metas ambiciosas. Oferecer um mecanismo de mercado pode ser uma saída para esses dois setores.

Mais da matéria aqui

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Clima de acordo

COP21 entra na semana decisiva de negociações para novo acordo climático

Agência Brasil 

A 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP21), em Paris, entrou hoje (7) na semana decisiva de negociações em que o alto escalão ministerial vai se debruçar sobre o rascunho de 48 páginas do novo acordo global climático finalizado no sábado (5). Os ministros de 195 países e da União Europeia devem aprovar o texto até sexta-feira (11).

Segundo o secretário-executivo do Observatório do Clima, Carlos Rittl, a primeira semana da COP21 serviu para que os negociadores deixassem o rascunho do acordo mais claro e mais enxuto. “O esforço foi para limpar o texto na primeira semana e os negociadores passaram para os ministros a tomada das grandes decisões”, informou.

De acordo com o secretário, o texto traz as opções de limitar o aumento da temperatura média da Terra a 1,5 grau Celsius ou a “bem abaixo” de 2 graus Celsius em relação a níveis pré-industriais. Rittl acompanha as discussões em Paris pelo Observatório, rede brasileira de articulação sobre mudanças climáticas globais, que conta com 38 instituições, entre membros e observadores.

Conforme Rittl, outra grande discussão é sobre a diferenciação entre os países em relação à mitigação - redução das emissões de gases de efeito estufa que causam o aquecimento global – e sobre financiamento para apoiar ações de redução de emissões e de adaptação de mudanças climáticas em países em desenvolvimento, especialmente os mais pobres.

“As grandes decisões serão tomadas esta semana, entre elas como os países se diferenciam na natureza de seus compromissos tanto de mitigação como de financiamento, quem deve assegurar recursos na mesa, se são só os países desenvolvidos ou também países em desenvolvimento que já atingiram determinado grau de desenvolvimento e poderiam contribuir. Isso está no rascunho”, afirmou o especialista.

Os meios de implementação do acordo, que abrangem transferência de tecnologia e capacitação, principalmente para países mais pobres, e como aumentar o nível de ambição dos países para maior redução das emissões até 2020, quando o Acordo de Paris deve entrar em vigor, são temas importantes que também estão sendo negociados, acrescentou Rittl.

Segundo especialistas da organização não governamental (ONG) WWF, o rascunho ainda mantém uma grande lacuna na questão de redução de emissões, o que, conforme a ONG, só será resolvido se os governos aumentarem a ambição, especialmente no período pré-2020.

Para o superintendente executivo de Políticas Públicas e Relações Externas do WWF-Brasil, Henrique Lian, o caminho foi bem pavimentado na primeira semana da COP21 com as mensagens dos chefes de Estado e de Governo e o trabalho dos diplomatas. “Assim, cresce a expectativa de um bom acordo no fim da semana, após o segmento ministerial. Certamente as habilidades do embaixador [Laurent] Fabius, presidente da COP, contarão muito nessa nova etapa.”

Chefe da delegação do WWF para as negociações climáticas da ONU em Paris, Tasneem Essop informou que os ministros estão em uma verdadeira corrida contra o tempo para garantir um acordo robusto até sexta-feira.

“A presidência francesa da COP agora tem a responsabilidade de nos levar para a linha de chegada. O rascunho do texto de negociação, apesar de mais claro em termos de opções, ainda reflete a maioria das divergências entre os países. Isso vai exigir uma enorme habilidade da parte da presidência francesa e absoluta cooperação entre os governos para mediar estas diferenças”, concluiu.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Urnas maduras

Resultado de eleições na Venezuela pode indicar esgotamento do neopopulismo

Agência Brasil

A vitória da oposição nas eleições parlamentares da Venezuela pode indicar o esgotamento do modelo neopopulista não somente na Venezuela, mas em toda a América do Sul, na avaliação do professor de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Caldas.

A oposição venezuelana conquistou 99 assentos de um total de 167 que compõem a Assembleia Nacional – contra 46 do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), do presidente Nicolás Maduro, obtendo maioria parlamentar pela primeira vez em 16 anos.

Os resultados eleitorais traduzem uma virada histórica depois da chegada ao poder do "chavismo" (de Hugo Chávez), em 1999. A oposição beneficiou-se do forte descontentamento popular na Venezuela com uma crise econômica provocada pela queda do preço do barril petróleo. Embora o país detenha uma das maiores reservas do produto do mundo, está atualmente imerso em uma situação de escassez de alimentos e bens de primeira necessidade.

Além do resultado na Venezuela, Caldas cita a vitória de Mauricio Macri, novo presidente da Argentina, eleito há pouco mais de 15 dias. O professor lembra que no modelo neopopulista não há abandono total das políticas econômicas, mas a preocupação com orçamento e controle da inflação é mínima. “É claro que quanto menos democrático é o país, mais você pode avançar nas políticas populistas. No caso do Brasil, que é um sistema democrático mais avançado que o argentino ou venezuelano, aí a contenção é maior”, acrescentou.

“A tendência é o neopopulismo ceder para políticas econômicas mais responsáveis, equilibradas. Se o neopopulismo quiser sobreviver a longo prazo, vai ter que dialogar com políticas econômicas consistentes”, enfatizou Caldas.

Já para o cientista político e professor de Política e Administração Pública da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Cláudio Gurgel, o resultado das eleições parlamentares não significam uma “mudança de rumo” na Venezuela. “Apesar de existir um histórico recente de maioria larga do chavismo no parlamento, é uma eleição mais permeável a movimentos locais. Portanto, tem um significado e um simbolismo que devem ser relativizados”, disse.

Na avaliação de Gurgel, o resultado é uma manifestação clara de insatisfação do eleitorado em relação a algumas políticas e também em relação a alguns políticos que estavam no Congresso venezuelano, mas não significa, necessariamente, uma derrota ao chavismo. "Não considero que isso signifique um julgamento definitivo sobre o chavismo. Até pelo traço de personalismo da política [venezuelana]. Há uma marca generalizada de personalismo na política seja nos países pouco desenvolvidos, seja nos centrais”, destacou.


“As eleições presidenciais têm outro significado. Seria de fato uma disputa mais representativa do apoio ou da negação do apoio da população venezuelana ao chavismo”, acrescentou Gurgel.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A dupla dívida de Léo de Brito


O novato (em mandatos e na idade) deputado federal Léo de Brito (PT-AC) tem ganhado as capas dos jornais brasileiros nestes dias turbulentos da política brasileira. Como membro titular da Comissão de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, o petista tem em suas mãos o poder de decidir se o processo de cassação do encrencado presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ganha corpo ou é enviado para a gaveta.

Léo de Brito está entre a cruz e a espada, assim como toda a bancada petista, liderada pelo também deputado acreano Sibá Machado. O Palácio do Planalto quer salvar o mandato de Cunha para evitar que ele dê início aos processos de pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Porém, as acusações contra Cunha são gravíssimas, e s provas contundentes. Ainda há a pressão popular pela saída do peemedebista. Segundo o Datafolha, 81% dos brasileiros defendem a cassação do parlamentar. Mas a decisão de Léo de Brito caberá muito mais aos seus padrinhos políticos do que a ele mesmo.

O petista deve aos irmãos Jorge e Tião Viana toda a sua trajetória política. Brito é o pupilo do vianismo da floresta. Foi com Jorge Viana no governo que ele virou presidente do PT no Acre. Atendendo aos caprichos dos Vianas na direção do partido, ganhou todo o apoio e estrutura do poder para decolar, superando nas urnas as figuras mais tradicionais da política do Estado.

Sem nunca concorrer a mandatos mais altos, a primeira disputa foi como deputado federal em 2010. Não foi eleito por muito pouco, ficando como suplente. Agora, em 2014, teve a benção de Tião Viana para ser o candidato a deputado federal do Palácio Rio Branco. Político de pouca ou nenhuma representatividade popular, contou com a mobilização da máquina do governo petista para garantir seus 20.876 votos.

Antes de tomar qualquer decisão sobre o futuro de Eduardo Cunha, Léo de Brito (ou o Léo do PT), terá que tomar as bênçãos de Tião Viana. Pelo histórico de Jorge Viana  -ao votar pela soltura do companheiro Delcídio do Amaral -, é provável que Brito ceda às pressões do Planalto, e livre o peemedebista da cassação –para desalento de 81% dos brasileiros.

A pressão recai muito mais sobre os ombros dos irmãos Viana do que propriamente do jovem petista, que nem bem começou sua carreira política e pode vê-la sepultada precocemente. E logo Brito que fazia discursos tão inflamados pela ética na política e acusava a oposição tucana dos mais virulentos crimes na administração do Acre e do País.


Lé de Brito tem uma dívida dupla: primeiro com Jorge e Tião Viana; a segunda com sua consciência (se é que há isso na atual conjuntura) e honrar o voto de seus eleitores que “apostaram” nele, sem o medo de perderem o cargo comissionado no governo, e que exigem o mínimo de ética por parte daqueles que deveriam ser escravos desta mesma ética.


P.S: Interessante ver lideranças tucanas e peemedebistas no Acre vociferando contra Lula e até levar porrada por isso, enquanto ficam calados e omissos diante de um dos maiores escândalos da política nacional, que é a presença de Eduardo Cunha na presidência da Câmara. Contra ele há as provas de contas secretas no nome de familiares com milhões de dólares que, conforme a Procuradoria da República, são oriundos de propina, e não da venda de carne moída. Pau que dá em Chico, também deve atingir Francisco, senhores.  

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Chico, a reserva e o boi

Aos 25 anos, reserva Chico Mendes já perdeu 7% de sua cobertura florestal 


FABIO PONTES

Expansão da pecuária ainda é grande desafio da Resex Chico Mendes
Idealizada por Chico Mendes para ser uma das principais frentes de resistência ante o avanço da pecuária na Amazônia durante as décadas de 1970 e 1980, a reserva extrativista que leva o nome do líder seringueiro, assassinado em dezembro de 1988 pelo filho de um fazendeiro, continua sob forte pressão do gado passados 25 anos desde o decreto de sua criação, e já perdeu 7% da cobertura florestal de seus quase um milhão de hectares.

De acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio), a a Reserva Extrativista Chico Mendes está a 30 mil hectares de atingir o limite máximo de desmatamento estabelecido há duas décadas em seu plano de manejo.  Dos 97 mil hectares previstos para sofrerem impactos com o desmatamento, 67.900 já não são mais floresta..

E é no entorno de Xapuri (AC), a terra de Chico Mendes, onde a reserva tem sido mais impactada pela atividade pecuária. Além do boi, a ocupação irregular de terra e o desmatamento ilegal colocam em risco a preservação de uma das últimas áreas de floresta na região leste do Acre.

Já em Capixaba, cidade vizinha a Xapuri, o plantio da cana-de-açúcar vem ganhando território graças a uma usina de álcool que tem o governo do Acre como um dos principais investidores.

Ao todo, a reserva tem 970.537 hectares espalhados por sete municípios acrianos (Xapuri, Brasileia, Assis Brasil, Capixaba, Epitaciolândia, Rio Branco e Sena Madureira).

“E a pecuária é a principal responsável por alimentar este desmate”, diz Silvana Souza, chefe da Reserva Extrativista Chico Mendes. O último censo realizado pelo ICMBio na reserva, de 2009, estimava a existência de 21 mil cabeças de bois.

Além da criação própria dos moradores, ainda há o chamado “gado de meia”, que é quando grandes fazendeiros arrendam pastagens dentro da unidade, deixando metade ou uma parte menor das cabeças levadas para a reserva como forma de pagamento aos seringueiros pelo uso do pasto.  

De acordo com Silvana Souza não há um limite máximo para a criação de bois nas propriedades. Segundo ela, a fiscalização do instituto se dá no tamanho da área de cada propriedade; se ocorrer desmatamento para se ampliar a pastagem o morador está sujeito a sofrer algum tipo de punição.    

O ICMbio considera como moradores legais as famílias cadastradas no levantamento de 2009; de lá para cá, quem passou a morar na unidade é classificado como “posseiro”. O instituto estima que há hoje 2.000 famílias morando dentro da unidade.

Boi x Extrativismo 

Dionísio, o Daú, presidente da Cooperfloresta
O lucro rápido e alto do boi é o que leva os moradores a investirem mais na pecuária do que em atividades extrativistas, como a coleta da castanha, o cultivo do açaí ou a extração do látex.

Apesar de investimentos terem sido realizados pelo governo do Acre nos últimos anos para garantir competividade ao extrativismo, este segmento ainda não se tem mostrado atrativo para quem vive dentro da reserva abandonar o boi.

Sebastião Pereira, 56, morador da reserva há 40 anos, tem na extração do látex e na coleta da castanha um complemento para sua criação de gado. Ele afirma ter 25 cabeças em sua propriedade de 700 hectares, divididos entre a pastagem e a floresta intacta. Por ano o lucro com o boi chega a R$ 6 mil; já com o extrativismo a renda é de R$ 2 mil.

“Se não fosse o boi nossa situação estaria bem pior do que já está”, diz Pereira observando os tratores que trabalham na melhoria das condiçõeso da estrada de barro (chamadas na região de ramal) que passa bem em frente sua casa.

O ramal vem sendo recuperado para oferecer condições de tráfego aos caminhões das toras retiradas do primeiro plano de manejo madeireiro da reserva Chico Mendes. Executado pela Cooperativa dos Produtores Florestais Comunitários (Cooperfloresta), o manejo está autorizado a explorar uma área de 917 hectares e retirar quase 13 mil metros cúbicos de madeira.

As duas associações de moradores (Rio Branco e Simitumba) das comunidades onde está autorizada a extração da madeira são as detentoras do manejo.

O manjo madeireiro é uma das apostas dos responsáveis pela reserva para tentar amenizar a pressão da pecuária, o desmatamento ilegal e incentivar as famílias a investirem no extrativismo. “O ICMbio tem muita expectativa [com o manejo[ porque a ideia é que a gente traga quem está ilegal para a atividade legal”, comenta Silvana.

Com a primeira retirada de madeira manejada de sua área este ano, Sebastião Pereira –o mesmo que apontou o boi como sua redenção econômica – obteve R$ 7,5 mil de lucro; R$ 1,5 mil a mais do que com o gado.

Já o agricultor Francisco Maurício Rios, 66, prefere apostar mais no roçado do que na pastagem. Em sua propriedade de 400 hectares divididos com outros dois irmãos ele planta mandioca, banana e milho.

O novo investimento dele são as seringueiras de cultivo. O látex extraído delas será vendido para a fábrica de preservativos mantida pelo governo estadual em Xapuri. Ao lado de sua casa está a esplanada, área onde são colocadas as toras retiradas do manejo comunitário.

“Tirei pouca coisa, não investi muito. É uma atividade nova para nós”, diz Rios. Ele não lembra quantos metros cúbicos extraiu, apenas o seu lucro: R$ 1,4 mil.    

A Cooperfloresta tem toda a sua madeira certificada pelo selo FSC, que assegura a adoção de práticas sustentáveis e de redução dos impactos ambientais no processo de extração da madeira. A certificação garante mais valor na hora de comercializar a produção.

“Nosso maior problema é a concorrência do desmatamento ilegal dentro da própria reserva. Queremos mostrar ao seringueiro que a madeira manejada é bem mais lucrativa e que pode ser uma fonte segura de renda”, diz Dionísio Barbosa de Aquino, o Daú, presidente da cooperativa.


Trator recupera "ramal" por onde passa toras retiradas de manejo
Amigo de Chico Mendes, Daú esteve ao lado do ex-seringueiro nos principais movimentos de resistência à entrada da pecuária na floresta, conhecidos como “empates” –correntes humanas colocadas em frente a máquinas e jagunços contratados pelos fazendeiros para abrirem pastos.

Se no passado ele formou os “empates”, este ano Dáu e sua cooperativa enfrentaram embates em torno da manejo madeireiro na reserva. O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri –berço da militância política de Chico Mendes – apresentou ao Ministério Público Federal denúncias relatando danos ambientais no processo de extração da madeira, e o pagamento de valores baixos aos seringueiros pelo metro cúbico da madeira.

A Cooperfloresta nega irregularidades, dizendo que o valor repassado a seus cooperados está acima do praticado pelo mercado comum. Sobre os impactos na floresta, a cooperativa afirma que segue todas as normas de boas práticas do manejo sustentável, e que nenhuma de suas operações é realizada sem a devida comunicação ao ICMbio.



ENTREVISTA 

Primo de Chico Mendes defende pecuária de subsistência e diz que manejo madeireiro tem menos impactos que boi 

Raimundo Mendes, o Raimundão, primo de Chico Mendes
Braço direito de Chico Mendes nos principais movimentos de resistência à entrada da pecuária no Acre entre as décadas de 1970 e 1980m Raimundo Mendes, 71, primo do líder seringueiro, defende a criação de pequena quantidade de boi entre os moradores da Reserva Extrativista Chico Mendes. Ele afirma ser contra, porém, a transformação dos extrativistas em médios ou grandes criadores de gado.

“Todo seringueiro tem o direito a ter suas cabeças de gado, não para ser um médio ou grande criador. Ele pode ter suas 10, 15 cabeças, e isso está autorizado” afirma ele.

Raimundão, como é chamado por conta de seus mais de 1,80 m, ainda vive do extrativismo no Seringal Floresta, em Xapuri. Além do látex e da castanha, desde o ano passado passou a ser manejador madeireiro comunitário.

Apesar de críticas terem sido realizadas pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri ao manejo madeireiro dentro da reserva –onde militou ao lado de Chico na década de 1980 – ele diz que o manejo, se bem praticado, causa bem menos impactos ambientais que a pecuária.

Raimundão concedeu a seguinte entrevista ao blog em sua passagem por Rio Branco após ter participado, no final de outubro, do Terceiro Chamado da Floresta, organizado em Santarém (PA) pelo Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS).
 
Como o senhor avalia a importância da Reserva Extrativista Chico Mendes nestes 25 anos? O que ela representou para o movimento seringueiro que lutou pela criação de uma unidade de conservação como esta?  

Raimundão: A nossa reserva foi fruto de uma luta muito grande. Ela tem sido um objeto de sossego para nós, seringueiros. Hoje nós não temos mais a presença do latifundiário. Hoje nós temos a presença do Estado, o que não existia antes. Eu nasci e me criei no seringal e sei bem disso. Nós não tínhamos o Estado levando para dentro da floresta aquilo que era nosso direito, como saúde e escola para nossos filhos. Isso só foi possível a partir de muita luta, tendo como liderança maior o companheiro Chico. A reserva nos trouxe tranquilidade. Os nossos produtos, principalmente na nossa região [Xapuri] tem valor. Nossa borracha tem valor graças à criação da fábrica de preservativo. Antes da fábrica vendíamos a borracha a R$ 0,60, quando muito R$ 1; agora recebemos R$ 8. A castanha saia por R$ 2 ou R$ 3 [a lata], hoje pagam mais de R$ 30. Hoje o Estado constrói ramais quando antes só se chegava ou saia da floresta por varadouros, e a energia elétrica está chegando.

Mas apesar desta valorização dos produtos da floresta citados pelo senhor a pecuária ainda continua sendo a principal fonte de renda para os moradores da reserva. Como o senhor avalia este conflito entre extrativismo e pecuária? 

Alguns seringueiros não percebem o valor e a importância que devemos ter com nossa reservam e se enganam vendendo suas áreas por R$ 30 mil, achando que terão uma vida melhor na cidade. Como os fazendeiros já não têm mais para onde expandir suas pastagens, eles procuram os seringueiros para colocarem seus bois dentro da reserva e muitos acabam aceitando pois parte daquelas cabeças será deles como acordo.

Como o senhor avalia a entrada do manejo madeireiro dentro da unidade como uma nova alternativa econômica para os seringueiros? O senhor acha que o manejo tem condições de se mostrar mais rentável do que o boi? 

O manejo é uma atividade que está se iniciando agora e que precisa de uma séria de adaptações. É algo ainda muito novo para nós. Só começamos a explorar este recurso a partir do ano passado. O manejo é uma atividade que vai ajudar na cesta [de alternativas econômicas] do seringueiro. Já temos a borracha, a castanha, sua pequena criação. Todo seringueiro tem o direito a ter suas cabeças de gado, não para ser um médio ou grande criador. Ele pode ter suas 10, 15 cabeças, e isso está autorizado. O gado para fornecer seu leite e sua carne [para o seringueiro]. O manejo madeireiro não é uma atividade predatória, desde que se faça dentro das regras de sua concepção. Ao tirar uma árvore temos o cuidado de que ela não maltrate aquelas que estão próximas. Já o pasto você derruba toda a área e ainda usa o fogo. Temos muita madeira dentro de nossa reserva, e se soubermos podemos explorar de forma sustentável. O bom seria se a madeira tirada da reserva fosse beneficiada ainda lá dentro, não sair só a tora. E isso estamos trabalhando com nossa cooperativa [Cooperfloresta] para implantar duas serrarias comunitárias que vão gerar mais ganho para o seringueiro, garantindo emprego para nossos filhos. O manejo pode não ser mais rentável que o boi, mais ambientalmente é bem melhor para nossa reserva; o manejo não devasta a floresta, a pecuária devasta.

Como o senhor avalia hoje a luta de Chico Mendes 30 anos atrás em defesa da Amazônia, pela manutenção da floresta em pé, pela criação de áreas protegidas, como a reserva que levou o nome dele? Qual o papel da reserva e de outras unidades de conservação neste atual debate de alterações no clima?  

A luta em defesa da floresta tem muito a ver com estas questões que estamos vendo nas mudanças climáticas. E se isso [a proteção da Amazônia] não acontecer o futuro será muito mais trágico. Nós seringueiros, extrativistas, moradores da Amazônia, precisamos estar unidos para evitar que nossas florestas continuem sendo dizimadas, pois elas sem dúvidas são um componente muito importante para o equilíbrio do planeta. Quando eu era criança, pois nasci e me criei no seringal, nunca pensei ver o que estamos vendo hoje, e não falo só da poluição dos carros, das fábricas, mas da perda de nossas florestas.

A criação das reservas extrativistas era a principal bandeira do Chico Mendes para preservar a Amazônia. O senhor acha que a criação destas unidades no Brasil só aconteceu por conta do assassinato do Chico, ou se ele estivesse vivo essa sua busca teria saído do papel? 

Tinha sim saído do papel. O Chico tinha um carisma, tinha um poder de dialogar, tinha uma boa habilidade política, um poder de mobilização. Não vai nascer outro seringueiro com esta mesma personalidade que tinha aquele caboco. Se não fosse a morte dele, nós o movimento, íamos fazer acontecer [a criação da reserva extrativista].



sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Dossiê Belo Montes

Dossiê Belo Monte: prevenção e mitigação não se concretizam e obra causa novos impactos sobre indígenas

Texto: instituto Socioambiental (ISA) 

A hidrelétrica de Belo Monte, em Altamira (PA), já está praticamente concluída sem que tenham sido implementadas as medidas previstas para proteger os territórios indígenas (regularização fundiária e fiscalização) e mitigar outros impactos. O resultado é que os povos indígenas da região perderam o controle sobre parte de seus territórios e os recursos naturais nele existentes. Eles vêm sofrendo com o aumento do desmatamento, riscos à segurança alimentar, piora no atendimento à saúde e perda de autonomia, entre outros impactos.

Mais que isso: a obra acabou trazendo outras consequências negativas não previstas. Em decorrência do atraso na contratação do Projeto Básico Ambiental do Componente Indígena (PBA-CI), foi implementado um Plano Emergencial, com 24 meses de duração. Nele, deveriam ser implantadas algumas ações de mitigação, antes do início efetivo da obra. Seu desenvolvimento, porém, deflagrou um dos processos mais perversos de cooptação de lideranças indígenas e desestruturação social promovidos por Belo Monte.

Os indígenas passaram a elaborar “listas de mercadorias” (incluindo todo tipo de bem de consumo, durável ou não), a serem fornecidas pelo empreendedor. Os impactos adversos sobre a organização socioeconômica e a autonomia política das aldeias foram diversos. O exemplo mais evidente é a perda da capacidade de produzir alimentos de forma contínua (segurança alimentar), o que teve graves consequências na saúde e autonomia dos povos indígenas da região.

As conclusões são do dossiê “Belo Monte – Não há condições para a Licença de Operação”, lançado pelo ISA no final de junho.


Leia o Dossiê aqui 

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Bela energia?

Ibama prevê que Belo Monte comece a gerar energia em 
março de 2016

Agência Brasil 

O diretor de Licenciamento Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Thomaz Miazaki de Toledo, disse hoje (24) que a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, deve começar a gerar energia em março de 2016 na casa de força principal. Segundo Toledo, o enchimento do primeiro reservatório ocorrerá nos próximos 50 dias.

O instituto concedeu nesta terça-feira licença de operação à empresa Norte Energia e autorizou o enchimento do reservatório da usina, que está em construção há quatro anos e cinco meses no Rio Xingu.

A presidenta do Ibama, Marilene Ramos, disse que mais de 90% das condicionantes ambientais foram cumpridas no projeto. “Postergar a licença de operação seria penalizar o Brasil porque essa usina possibilitará, quando estiver funcionando plenamente, o desligamento de 19 usinas termelétricas que emitem 19 milhões de toneladas de carbono equivalente ao ano.”

Marilene destacou que adiar a concessão da licença seria atentar contra a “modicidade tarifária”, pois a geração de energia térmica é mais cara.

Segundo a presidenta do Ibama, esta é apenas mais uma etapa do licenciamento ambiental. “Qualquer descumprimento das condicionantes ensejará medidas contra a Norte Energia. Isso vale para o reassentamento da população, a pesca, o componente indígena”, disse Marilene. Ela acrescentou que o Ibama tem uma equipe fixa em Altamira para fazer o acompanhamento das exigências estabelecidas e que essa turma deve ficar no local, a princípio, por três meses.

Toledo reforçou que o licenciamento ambiental do empreendimento não se encerra com a licença de operação. “É apenas uma etapa do processo. A partir do enchimento do reservatório, vamos passar para uma nova fase do projeto em que novos impactos passarão a ocorrer. Há uma série de obrigações que a Norte Energia terá que cumprir no âmbito da licença de operação.”

Em nota, a Norte Energia informa que Belo Monte terá capacidade instalada de 11.231 megawatts (MW), energia suficiente para abastecer até 60 milhões de pessoas. Em leilão realizado em 2010, 70% da energia da hidrelétrica foi vendida para concessionárias de distribuição de energia elétrica e vai ser distribuída em 17 estados, segundo a empresa.

“Para o cumprimento do projeto básico ambiental, foram investidos cerca de R$ 4 bilhões em ações socioambientais nos cinco município da área de influência direta de Belo Monte: Altamira, Anapu, Brasil Novo, Senador José Porfírio e Vitória do Xingu”, acrescenta a nota da empresa.

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Inverno quente



O mês de novembro em parte da região amazônica tradicionalmente é um dos mais chuvosos do ano. Ele representa o início do chamado “inverno amazônico”, que é o período de intensas chuvas e que se estende até o fim de abril. Mas em 2015 a situação tem sido bem diferente, e tudo por conta do El Niño, o aquecimento das águas do Pacífico.

Esta foto retrata bem os efeitos do fenômeno na Amazônia. O período de estiagem prolongado causa a vazante dos rios. Em Manaus, o rio Negro chegou a registrar uma de suas menores cotas este ano, com sérias consequências para a navegação. Áreas antes tomadas pelas águas agora formam grandes praias. A seca afeta diretamente as populações ribeirinhas, que dependem dos rios para sua sobrevivência.

Aliás, o El Niño tem causado impactos em todo o Brasil e no mundo. Enquanto o Norte tem temperaturas elevadas, secas e queimadas, no Sul a chuva e tempestades castigam a população.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Desastre mineral

Samarco admite que duas barragens podem se romper em Mariana

Agência Brasil

Representantes da Samarco, mineradora responsável pela barragem que se rompeu em Mariana (MG) no dia 5, disseram hoje (17) que há riscos de rompimento das represas de Santarém e de Germano, que ficam próximas à primeira. Eles afirmaram ainda que a de Santarém não se rompeu, diferentemente do que a empresa informou.

“Tem o risco e nós, para aumentarmos o fator de segurança e reduzirmos o risco, estamos fazendo as ações emergenciais necessárias”, disse o gerente-geral de Projetos Estruturais da Samarco, Germano Lopes.

“O monitoramento dessas barragens está sendo feito de forma online. Todos os dias os fatores de seguranças são reportados. A gente não percebeu ainda nenhuma movimentação nessas barragens. Existe uma plano de ação montado [caso haja rompimento da barragem]”, completou o diretor de Operações e Infraestrutura da empresa, Kléber Terra.

Segundo Terra, o fator de segurança na barragem de Santarém é 1,37. Na de Germano, o dique Celinha, uma das estruturas, tem índice de 1,22, o menor em todo o complexo. Esse índice vai de 0 a 2. O nível mínimo de segurança recomendado por lei é 1,5.

De acordo com os técnicos, estão sendo feitas obras emergenciais nas duas barragens, com a colocação de blocos de rocha de cima para baixo para reforçar a estrutura. Nesta semana, o Corpo de Bombeiros de Minas Gerais divulgou imagens feitas por drones da corporação que mostram uma rachadura na barragem de Germano.

“Nós estamos com aproximadamente 90 dias para transportar todo o material lá pra baixo, fazermos o preenchimento da erosão na margem direita, nivelamento da crista da barragem, de forma a aumentar o nível de segurança da estrutura e permitir o tratamento da água dentro do reservatório de Santarém”, disse o engenheiro e geotécnico da empresa José Bernado.

Nesta terça-feira, os representantes da empresa explicaram que a única barragem que se rompeu foi a de Fundão, diferentemente do que a própria Samarco informava desde o dia da tragédia. A empresa dizia que, além de Fundão, Santarém havia rompido. Segundo os técnicos, 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos desceram, erodindo Santarém.

Para o Kléber Terra, “não é o caso de pedir desculpas” à população pela tragédia. “Nós somos profissionais orgulhosos dessa empresa. Não acho que seja o caso de pedir desculpas. É o caso de verificar claramente o que aconteceu. Nós somos parte de um processo que foi muito sofrido para tudo mundo”, afirmou o diretor de Operações e Infraestrutura da Samarco. Ele disse ainda que "não está poupando recursos" para investigar as causas do rompimento.


O rompimento da barragem de rejeitos da Samarco, que tem como acionistas a Vale e a BHP Billiton, criou uma onda de lama que destruiu o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana. A lama atingiu outros municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo e chegou ao Rio Doce, causando a morte de animais e prejudicando o abastecimento de água. Doze pessoas permanecem desaparecidas. Sete mortos foram identificados e quatro corpos aguardam identificação.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Extremos amazônicos

Na Amazônia, Estados mais impactados pelo agronegócio têm menores índices de extrema pobreza 

Balsa é carregada com soja, no rio Madeira, em Porto Velho (RO)
Motivo de perda de sono para ambientalistas que atuam na Amazônia, o agronegócio vem se apresentando nos últimos anos como um dos caminhos mais curtos para a redução da pobreza e suas consequências na região Norte. Pelo menos esta é a conclusão que se pode tirar a partir do “Atlas da extrema pobreza no Norte e Nordeste do Brasil”, referente a 2010, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

De acordo com os dados, Rondônia e Tocantins, Estados que tiveram boa parte de sua vegetação natural impactada por este setor da economia, apresentam os menores números de pessoas vivendo na pobreza e extrema pobreza. Na outra ponta, Amazonas, Acre, Amapá e Roraima, com extensas áreas de floresta mantida em pé em seus respectivos territórios, estão com os piores desempenhos.

Quando se analisa as condições de vida das populações rurais dos Estados amazônicos, Rondônia e Tocantins voltam a ter larga vantagem sobre seus vizinhos. Enquanto o Amazonas (com 90% de floresta preservada) tem 32% de sua população vivendo na pobreza, em Rondônia este índice cai pela metade: 16%.  Rondônia tem a oitava maior pecuária do país e figura entre os principais produtores de soja. Em Tocantins a pobreza chega a 22%.

O Amazonas é seguido por Acre (31%), Roraima (27%) e Amapá (25%). Mas atribuir somente aos negócios do campo benefícios na economia regional cai por terra ao se analisar o Pará, que apresenta os mesmos 32% do Amazonas de habitantes na pobreza. O Pará é um dos que mais sofrem impactos com o desmatamento para a ampliação de pastagens e áreas de cultivo de grãos.

Isso, contudo, não se apresenta o suficiente para o enfrentamento à miséria. A concentração de grandes porções de terra nas mãos de poucos grupos dominantes, a ausência do Estado na intermediação de conflitos e adoção de políticas para um equilíbrio na geração de riquezas são vistos como fatores para empurrar os paraenses para a pobreza.

Quando se analisa a população rural da Amazônia, o Pará tem 56% das pessoas que integram este grupo vivendo na pobreza, e outros 32% na extrema pobreza. Em Rondônia estes números são, respectivamente, de 36% e 14%. O Amazonas é o campeão de moradores do campo em situação de pobreza: 68%; logo abaixo seguem Roraima (62%) e Amapá (57%).

Como se pode observar a partir do atlas elaborado pela ONU, atribuir às atividades da pecuária e agricultura as únicas saídas para uma melhor qualidade de vida para os 25 milhões de habitantes da Amazônia é um risco. O Pará fica como exemplo de que, não basta somente desmatar a floresta em busca de alternativas, é preciso o envolvimento do poder público para se amenizar as distorções.

Rondônia e Tocantins aparentam ter feito o papel certo, apesar de ambos ainda terem muitos desafios a vencer. Além de fomentar as atuais atividades bem-sucedidas do ponto de vista econômico e social para as comunidades locais, exige-se a adoção de novas práticas que gerem melhores resultados. A floresta mantida em pé, com seus recursos explorados de forma sustentável, pode ser um grande ativo econômico nas próximas décadas.  

Por sinal, a atual conjuntura do Planeta exige uma Amazônia preservada e conservada...

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Educação navegante

Reportagem do jornal “A Crítica” mostra como o comportamento dos rios na Amazônia –com vazantes e enchentes cada vez mais intensas – influenciam o desenvolvimento do ensino dos filhos dos ribeirinhos e outras comunidades.



Veja a matéria aqui

sábado, 7 de novembro de 2015

Made in Rondônia


A séria de nossa trágica comédia o Acre não Existe ganha mais um interessante capítulo: a falência da fábrica da Coca-Cola em Rio Branco. A última notícia que alguém poderia esperar seria a do fechamento de uma unidade produtora do refrigerante mais desejado e vendido do mundo –isso mesmo em tempos de crise. Mas como o Acre é o Acre, isso aconteceu por estas bandas.

O fato poderia ser hilário não fosse a tragédia de quase 200 pessoas ficarem desempregadas num Estado de economia já cambaleante e com raríssimas ofertas de emprego. O mais interessante é vermos o fechamento de uma fábrica em tempos em que o governo prega a prosperidade econômica do Acre, fazendo-nos acreditar que somos modelo para Estados Unidos, China, Japão e até Marte, onde talvez a fábrica da Coca fechada aqui seja aberta já que descobriram água por lá.

O governo Tião Viana (PT) até mudou o slogan da gestão neste segundo mandato para enfatizar o nosso salto rumo a um PIB chinês (Governo parceiro, povo empreendedor). Como tudo o que acontece há quase 20 anos de Frente Popular comandando o Acre, trata-se de mais uma propaganda enganosa, entre muitas. A Zona de Processamento de Exportação (ZPE), que seria nossa redenção, até hoje não saiu do papel mesmo com os milhões de reais já torrados.

Nenhuma indústria do país mostra interesse em investir nela. Se as poucas que ainda funcionam no Acre já estão arrumando as malas, o que dirá alguma desembarcar.

Enquanto isso o governo vai beneficiando empresas onde há o interesse direto deste mesmo governo, como a nova indústria de madeiras em Manoel Urbano, a Agrocortex. Para se instalar no Acre ela recebeu incentivos fiscais de R$ 135 milhões. Já outros setores da economia enfrentam sérias dificuldades e não veem outra alternativa senão a de encerrar as atividades.

A boa notícia é que nem tudo está perdido. Continuaremos a beber Coca-Cola. O problema é que, para os intelectuais do governo Tião Viana, haverá sempre o gosto amargo de ver nas embalagens dos refrigerantes da marca o selo “Made in Rondônia”.

(P.S. Em tempos da falência até da esquerda brasileira, de uma coisa os petistas acreanos terão orgulho: dirão que arruinaram o maior símbolo dos imperialistas ianques. Nem tudo está perdido no Acre)


quinta-feira, 5 de novembro de 2015

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

El Sí de Evo

Foto: Agência Boliviana de Informação
Nunca antes na história nossos vizinhos bolivianos foram tanto às urnas como nesta quase uma década do mesmo presidente ocupar o cargo. Tal constatação aparenta ser contraditória para um país onde os opositores definem Evo Morales como “ditador”, “tirano” e “antidemocrático”.

Depois de garantir o terceiro mandato a Morales no ano passado, a Bolívia volta às urnas no início de 2016 para dizer se o líder esquerdista tem direito a concorrer a mais um mandato em 2019, e ficar no cargo até 2025.

Perdeu as contas? Ele está no cargo desde 2006; até aqui já são nove anos de governo. Com uma eventual re re reeleição em 2019, terá somado quase 20 anos de domínio político. Este também era o projeto do PT no Brasil, mas por se ver encharcado nas denúncias de corrupção e na crise econômica, o partido poderá se contentar somente com 16 anos – isso se a companheira Dilma não deixar o cargo antes (mesmo com a ameaça de intervenção militar da Bolívia no Brasil).

Ao contrário do Brasil, a Bolívia está muito bem, obrigado, no tocante à economia. O vizinho é o que mais cresce na América do Sul, com taxas superiores a 5% ao ano, enquanto nós estamos em recessão amarga. E isso favorece a permanência de Evo Morales na presidência.

Pesquisa do instituto Ipsos publicada no fim de outubro aponta que 48% dos bolivianos votarão no “Sim” no referendo sobre o direito ou não de Morales de disputar o quarto mandato. Os dados mostram uma nação dividida, algo que é característico desde que a Bolívia é Bolívia.

Enquanto o presidente goza de ampla vantagem entre os moradores da zona rural (leia: indígenas, onde ele iniciou sua militância política), nas cidades a situação é menos confortável. A diferença do “Sim” para o “Não” em, todo o país é de 10% - no campo esta diferença salta para 33%.

Se a nação mais pobre de nosso continente continuar a registrar bom desempenho na economia até a data prevista do referendo (21 de fevereiro de 2016), é muito certo que o “Sim” ganhe. Agora, saber se essa mesma economia permanecerá dinâmica e beneficiando os eleitores até a próxima eleição, é a dúvida, que alimenta outra dúvida: a capacidade de Morales em obter o quarto mandato.

Analistas preveem que este ciclo de crescimento da Bolívia já está se esgotando. Percebendo isso, Morales anda pelo mundo em busca de novos parceiros econômicos. Com seus grandes financiadores como Venezuela, Brasil e Argentina encrencados até o pescoço com seus problemas internos, a solução foi atravessar o Atlântico. Esta semana Evo Morales cumprirá uma série de agendas na Europa, começando com a poderosa Alemanha. Lá, foi recepcionado por Angela Merkel.

Mas, independentemente de prognósticos, Morales já entrou para a história como o presidente boliviano a permanecer por mais tempo no cargo. Numa nação onde se dormia numa noite com um presidente e acordava com outro, já é um grande feito. E isso aconteceu sem a necessidade do uso de armas ou golpes militares.

Mesmo assim, seus críticos questionam o modo centralizador e autoritário de governo, sufocando a oposição e colocando sob sua batuta os poderes Legislativo e Judiciário, que chancelam sem nenhum questionamento as decisões políticas do presidente.

E assim caminha a Bolívia...

 

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Desmatamento zero


Para a prefeitura de Rio Branco (AC), cidade boa é assim: sem arborização e com árvores no chão 

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Ouro negro, verde destruido

Eleito presidente do Peru como a promessa de se tornar umas das estrelas da “nova esquerda” na América Latina, Ollanta Humala tem se mostrado o mandatário mais complacente e companheiro das grandes petrolíferas internacionais que atuam no país vizinho, e que têm deixado um rastro de destruição na Amazônia peruana. Há tempos a esquerda no Peru e em parte do continente denuncia que as grandes corporações de mineração e petróleo são quem dão as cartas por Lima.

E de fato parece ser. Estudo produzido pela organização não governamental “Convoca” aponta que o governo de Humala tem sido generoso ao perdoar, reduzir ou deixar de cobrar multas milionárias aplicadas pelo órgão de regulação ambiental, a OEFA, contra as empresas pelos sérios danos provocadas na Amazônia.

Segundo o relatório, o Peru deixou de arrecadar das petrolíferas, pelas medidas do governo Humala, o equivalente a 55 milhões de soles –isso somente entre junho de 2014 e agosto deste ano. As autuações foram aplicadas entre 2008 e 2013; até hoje os peruanos não viram as empresas serem penalizadas, e muito menos ter o dinheiro usado para compensar os estragos na floresta.

Um dos lagos que servia como fonte de água para os moradores das comunidades na região de Iquitos, o Shanshococha, é o símbolo da atuação predatória das petrolíferas. A água está contaminada pelo petróleo e outra parte do lago já secou. Animais que antes frequentavam a área migraram em busca de outras fontes. De acordo com estudos do órgão ambiental do Peru, foram encontradas substâncias químicas em uma quantidade 1.500% acima do nível considerado normal no solo.

E toda esta fonte de contaminação está bem ali próxima: são três poços de petróleo explorados pela empresa argentina Pluspetrol Norte, multada em R$ US$ 1,8 milhão pela destruição do lago Shanshococha. A Pluspetrol Norte lidera o ranking das petrolíferas autuadas pela OEFA.

Mas o bom companheiro Ollanta Humala fingi que nada vê e permite a impunidade das gigantes do petróleo responsáveis pela destruição da Amazônia peruana.

Gás judicial

MPF quer fim de processo para exploração de gás e petróleo no Acre 

Para procurador, atividade poderia causar sérios impactos numa das regiões mais ricas em biodiversidade no mundo 

Assessoria MPF/AC

O Ministério Público Federal ajuizou, em Cruzeiro do Sul, uma ação civil pública pedindo a anulação de todo o processo de licitação e consequente outorga de contrato para a exploração e produção de petróleo e gás natural referentes ao lote AC-T-8, que engloba terras na região do Vale do Juruá entre os estados do Acre e Amazonas.

A ação foi ajuizada em face da União, do Ibama, da Agência Nacional de Petróleo (ANP) e da Petrobrás, já que, segundo o MPF, a licitação promovida pela ANP, contém, desde o seu princípio, até a outorga do contrato firmado com a Petrobrás, graves ilegalidades tanto do ponto de vista ambiental, quanto social.

O procurador da República em Cruzeiro do Sul, Thiago Pinheiro Corrêa, responsável pela ação, apresenta as deficiências do processo alegando que, do ponto de vista social, não foi levado em conta o imenso impacto causado pela atividade de exploração e produção na região, povoada por comunidades indígenas e tradicionais e que, segundo a Constituição Federal e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, deveriam ter sido previamente consultados sobre o tema.

Além disso, do ponto de vista ambiental, existem outros diversos vícios no empreendimento, como a controvérsia sobre a exploração de gás de folhelho (popularmente conhecido como gás de xisto), cuja técnica de exploração (fracking) pode provocar danos irreversíveis como a contaminação de água, de ar, além da fragilização do solo rochoso, o que poderia levar até a ocorrência de abalos sísmicos na região.

Para dar exemplo da dimensão do dano, o aquífero Içá, um dos principais mananciais subterrâneos da Amazônia, corre o risco de contaminação pelo descarte de águas carregadas com substâncias químicas utilizadas no processo, além de vazamentos de metano, isso sem contar o próprio volume de água a ser utilizado.


segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Violência no Norte

Silane Souza 
A Crítica 


O Amazonas tem uma das maiores taxas de casos de violência doméstica na região Norte do País, 33,5 ocorrências a cada 100 mil habitantes, ficando atrás apenas de Roraima (53,32) e Tocantins (57,31). Em Manaus, esse índice é de 28,75. No caso dos Estados que mais carecem da presença do poder público para combater esse tipo de situação, o Amazonas  também está na lista.

Os dados são do “Diagnóstico dos Homicídios no Brasil: Subsídios para o Pacto Nacional pela Redução de Homicídios”, elaborado pelo Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp) do Ministério da Justiça (MJ). O estudo, que será usado como ferramenta para desvendar os motivos que levam aos homicídios e para elaborar políticas públicas de combate à violência, foi divulgado quinta-feira.

As análises sobre a Região Norte, os Estados e os municípios selecionados para o Pacto de Redução de Homicídios, mostraram que no Amazonas não houve nenhum indicador considerado bom. Os índices medianos foram os de violência doméstica, presença do Estado e conflitos da polícia com a população. Os ruins são os transversais, de gangues e drogas, violência patrimonial e violência interpessoal.

O diagnóstico revela que a violência no ambiente doméstico tem como principal vitima mulheres, e de todas as idades. Trata-se de uma violência essencialmente patriarcal. Também afirma que os homicídios de mulheres, crianças e idosos se relacionam com as relações violentas de poder dentro do ambiente doméstico ou baseadas em relações de parentesco.

Entre os municípios da região Norte analisados, a capital amazonense apresentou taxa intermediária no caso de homicídios de crianças, 3,04 casos, de um índice que varia de 1,9 a 5,8, por 100 mil habitantes. As taxas de homicídios de mulheres, bem como de idosos, consideradas altas no Norte, deixaram Manaus em terceiro lugar com as menores proporções, 6,51, e 21,49, respectivamente.

O estudo aponta que no caso da violência interpessoal (familiar, na relação íntima ou comunitária), o uso de álcool e drogas pode ser observado como um fator que potencializa as consequências extremas da violência doméstica. A ausência de uma rede de proteção específica e de serviços do Estado que atentem para as especificidades das diferentes violências domésticas e dos riscos associados a elas também pode ser observada como um fator de risco para os homicídios associados a esse fenômeno.

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quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Histórico insustentável

O investimento público-privado realizado pelo Acre em mais um empreendimento para a viabilização industrial do manejo madeireiro sustentável tem sido motivo de polêmica –muito mais pela sua viabilidade econômica do que pela questão ambiental. O governo volta a conceder incentivos fiscais (e em tempos de crise financeira) para tentar alavancar um segmento da economia que até o momento não conseguiu se viabilizar, isso mesmo em um Estado com quase 90% de cobertura florestal.

Para atrair o grupo de investidores europeus da Agrocortex, o Acre abriu mão de R$ 135 milhões de sua principal fonte de arrecadação: o ICMS. A iniciativa é louvável e necessária para um Estado pobre e com raríssimos investimentos deste porte. Sobretudo quando a área beneficiada é o paupérrimo município de Manoel Urbano, que apresenta um dos piores índices de desenvolvimento social e econômico do país.

Mas diante do retrospecto dos investimentos na indústria do manejo florestal no Acre, fica a dúvida sobre a sustentabilidade comercial do negócio. Os exemplos do fracasso desta política saltam aos olhos. A mais evidente é a fábrica de tacos em Xapuri. Construída no governo Jorge Viana (1999-2006), a fábrica tinha como missão tornar o Acre uma potência do Norte no manejo da madeira, bem como seu beneficiamento e exportação.

Passados quase dez anos de sua inauguração, a fábrica é o símbolo do fiasco às margens da BR-317 –um elefante branco na terra de Chico Mendes. Outros empreendimentos (e estes privados) do mesmo ramo passam por sérias dificuldades. A informação é de que a Triunfo –símbolo da economia verde do governo Jorge Viana – opera com capacidade reduzida.

Portanto, saber se a Agrocortex se sustentará em um Estado já com histórico de falência do setor é muito incerto. A torcida é para que, sim, tudo funcione e garanta desenvolvimento para Manoel Urbano e o Acre. Em toda a região Norte o manejo florestal para fins industriais tem se mostrado viável. Estados como Amazonas, Pará e Rondônia investem pesado no ramo –e tem dado certo.

O problema no Acre é a ingerência estatal em todo e qualquer empreendimento econômico. A vocação do Palácio Rio Branco de interferir até na padaria do seu Zé tem deixado o Acre eternamente refém da economia do contracheque, o que garante aos governantes a vantajosa zona de poder para influenciar eleições, e assegurar reeleições.

Se o governo não meter demais o nariz onde não é chamado e muito menos bem-vindo, a Agrocortex pode dar certo. Mas se assim não for, terá o mesmo destino da fábrica de tacos, sendo um gigante fantasma mal-assombrado às margens de uma rodovia. A diferença da empresa é que está instalada às margens do rio Purus -e para nossa sorte Euclides da Cunha navegou pela região mais de cem anos atrás.  

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Impacto rodoviário

Rodovia que tira Manaus do isolamento volta a ter obra embargada 

A Crítica 

O Ibama embargou as obras realizadas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) na rodovia BR-319, no trecho entre os quilômetros 250 e 655,7 (Humaitá-Manaus), após constatar irregularidades e graves danos ambientais. Foi emitido auto de infração no valor de R$ 7.510.500,00.

A decisão foi baseada em um relatório concluído em agosto pela superintendência do Ibama no Amazonas, que apontou a execução de obras sem licença ambiental adequada e diversas irregularidades.

Entre os problemas encontrados estão a supressão de Área de Preservação Permanente (APP), estocagem de madeira sem licença, destinação irregular de efluentes, utilização de material de jazidas, intervenções em corpos hídricos, alargamento de pista, construção de bueiros, desvio de ponte danificada e alojamentos para trabalhadores sem condições mínimas de segurança e salubridade.

A BR-319, que liga Porto Velho e Manaus, possui três trechos em obras. Para o trecho central, de 405,7 km, o Ibama emitiu em 2007 um Termo de Referência que solicitava a realização de Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (Eia/Rima).

Em 2009, após a devolução de dois estudos, uma terceira versão do Eia/Rima foi elaborada pelo Dnit. O documento, porém, não reuniu subsídios mínimos para verificar a viabilidade ambiental do empreendimento.

Em 2014, o Dnit obteve junto ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) licença ambiental para realizar a manutenção e recuperação da rodovia. No entanto, foram constatadas obras de implantação e pavimentação em vistoria do Núcleo de Licenciamento Ambiental do Ibama no Amazonas.

O Ibama emitiu auto de infração e termo de embargo, cujas cópias serão encaminhadas aos ministérios públicos Federal e do Trabalho. A equipe de fiscalização permanecerá monitorando a rodovia para verificar o cumprimento da decisão.

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Na pobreza e na pobreza

(Foto: Assessoria PMAC)
Este policial da Força Nacional de Segurança saiu do Maranhão para combater a violência no Acre. Ele trocou a miséria e a violência sociais da terra dos Sarneys pela mesma violência no Acre do vianismo; trocou seis por meia dúzia.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Uma bomba social

A sociedade acreana vem assistindo atônita ao espetáculo do crime organizado que, de forma ousada, ataca o patrimônio coletivo, ameaça a integridade das pessoas e impõe um toque de recolher aos cidadãos de bem. Quem estuda o Acre a profundo, analisando dados sociais e econômicos de instituições sérias de pesquisa, não fica tão espantado assim. E quem de fato conhece o Acre real da capital e interior, andando por suas periferias, sabia que um dia este barril de pólvora iria explodir.

Esta atual crise da segurança pública não é um simples retrato de que o Estado tenha falhado nas políticas do setor. Muito pelo contrário. Nunca antes na história as forças policiais tiveram tantas condições de atuar. O Acre investe mais em segurança do que Estados ricos como São Paulo ou Distrito Federal, como mostra o mais recente dado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Segundo o IBGE, temos uma das melhores proporções no País de policiais militares por habitante. Então onde está a falha para explicar esta crise? A resposta é simples: a problemática do Acre não é somente de repressão policial, mas vai bem além: trata-se de uma questão social e econômica.

O Acre é um Estado pobre, sem geração de riquezas, com uma iniciativa privada incipiente e altamente dependente da economia estatal, já que o poder de compra de uma população pobre é baixíssimo. Não houve nos últimos anos políticas sérias para o real desenvolvimento sustentável do Acre – e aqui a sustentabilidade não é só do ponto de vista da preservação ambiental.

Sustentável no sentido de ser progressivo, duradouro e capaz de gerar riqueza e oportunidades a quem mais necessita. O que se viu muito foi o aperfeiçoamento da máquina estatal, um aparelhamento da coisa pública que agora mergulha a sociedade num bolsão de miséria.

O Acre se endividou com a promessa de investir milhões em empreendimentos econômicos, mas a maioria não deu certo (vide a falida fábrica de tacos, em Xapuri).

O resultado disso tudo está aí à vista: quase metade da população depende da assistência do Estado por meio de programas de transferência de renda (Bolsa Família), a educação pública não leva o cidadão a sua formação crítica e à conquista de sua autonomia, nossos presídios estão superlotados e as facções criminosas agora ditam as regras no Acre.

Enquanto o governo não é capaz de colocar em prática políticas econômicas viáveis, o tráfico de drogas –com seu lucro rápido e farto – ganha território entre uma população jovem desempregada e sem perspectiva. A comprovação disso é a faixa etária da população carcerária do Acre; mais de 60% têm entre 18 e 29 anos, sendo a condenação por tráfico a predominante.

É óbvio que o Estado precisa, neste momento, responder com o uso da força, a repressão. O Estado precisa dizer quem manda na área é ele. Após reconquistar seu território, será papel do governo repensar seriamente suas políticas sociais e econômicas, deixando de lado o imediatismo e a mídia. O debate precisa ser aberto em todos os segmentos; nos partidos, na academia, nos sindicatos e na imprensa.

O que não pode é tudo continuar como agora. Mais alguns dias a sensação de segurança será retomada, mas logo PCC e outras facções voltarão a aterrorizar, e ficaremos neste nosso enxugar gelo. O Acre precisa mudar sua atual trajetória rumo a uma falência social. Se assim não proceder, os resultados serão catastróficos para a sociedade muito em breve.