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sábado, 28 de maio de 2016

Os prefeitos peões

Vivendo em Manaus há seis meses, aos poucos vou conhecendo mais da realidade política amazonense. A conclusão é a de que, não, não há diferenças entre as lideranças daqui e do Acre, terra onde nasci e desenvolvi meu jornalismo na última década. Assistindo às propagandas partidárias notei que a proximidade entre Acre e Amazonas não se dá somente no campo geográfico ou histórico –afinal de contas, foram os barões da borracha daqui os principais financiadores de nossa dita “revolução” para tirar o Acre da Bolívia.

Com a proximidade das eleições municipais (sim, teremos eleições este ano) percebo que o uso e o abuso da coisa pública acontecem lá e acolá. Por aqui, o espaço da propaganda partidária que deveria ser usado para apresentar as bandeiras e ideias dos partidos, é aproveitado meramente para entalecer a imagem do prefeito tucano Arthur Virgílio Neto.

Isso representa uma afronta à legislação eleitoral, pois as propagandas partidárias não podem ser usadas para este fim eleitoreiro de um prefeito que disputará a reeleição. Tal comportamento é mais uma amostra da crise política brasileira, na qual os partidos políticos há muito perderam seu nobre propósito dos regimes republicanos, tornando-se meros instrumentos para achaques e barganhas de seus donos.

O fato também revela a crise das instituições estaduais em ambos os Estados, com os órgãos de fiscalização e controle completamente cegos, surdos e mudos para as afrontas cometidas pelos caciques do Executivo.

Na propaganda do PSDB, há uma plena exaltação ao prefeito de Manaus, com ele mesmo sendo o protagonista. Arthur é chamado por um dos eleitores entrevistados de o “prefeito peão” por estar todos os dias nas ruas com seu emblemático colete azul vistoriando as obras da prefeitura e apertando a mão do povo. Alguma semelhança com os petistas acreanos?

O prefeito de Rio Branco, Marcus Alexandre (PT), também recebe esta alcunha de “prefeito peão” por ser visto nas ruas vistoriando, in loco, cada obra de sua gestão, metendo o pé na lama e com a água até a cintura em épocas de cheia do rio. O prefeito que foi vendido na campanha eleitoral de 2012 como o “novo” em meio a lideranças carcomidas do petismo acreano, soube como ninguém explorar o marketing pessoal para se desvencilhar, ao máximo, da imagem desgastada de seu partido e seus padrinhos, os irmãos Viana.

E isso parece ter dado certo, pois tornou-se um dos prefeitos mais populares de Rio Branco, idolatrado pelo “povão” –uma parte dele – por sua simpatia e desenvoltura por ouvir muito e prometer na mesma medida, mas sem solucionar bastante coisa. Manaus e Rio Branco têm como semelhança as suas ruas tomadas pela buraqueira. Basta sair das avenidas principais e seus viadutos para ver as crateras  invadindo os bairros.

Uma das medidas de Arthur Virgílio para amenizar o desgaste da pouca eficiência de sua gestão foi congelar o preço da tarifa de ônibus na cidade, hoje em R$ 3. As empresas de ônibus recorrem à Justiça, ganham liminares, a prefeitura recorre. Enquanto fica o impasse, a população paga por um serviço de transporte público nada satisfatório.

Sem o reajuste das tarifas, com a inflação subindo seus custos operacionais e os funcionários cobrado aumento salarial, as empresas parecem fazer um boicote reduzindo o número de ônibus em circulação. Passou a ser frequente ver os coletivos quebrados, tumultuando um trânsito já não o dos melhores.

Como se pode ver, não existe nenhuma diferença entre os políticos, podendo ser do PT ou do PSDB. A aparelhagem da máquina é a mesma, mas a eficácia da gestão é a mínima quando se coloca pessoas incompetentes para administrar a coisa pública apenas para “comprar” aliados e garantir apoios para a próxima eleição.

O resultado desta prática nefasta e imoral na política brasileira salta aos olhos com a pior crise política, ética e econômica por que este País passa.

quinta-feira, 19 de maio de 2016

Não "passaralhos"

A superintendência do Banco do Brasil no Acre deu início nas últimas semanas a uma série de pressões sobre o governo estadual para ter de volta, em sua carteira de clientes, servidores públicos que há 15 anos decidiram encerrar suas contas na instituição e optaram por receber os salários por meio das cooperativas de crédito. Com a possibilidade de participar da divisão das sobras (lucros) e atraídos por taxas de juros bem mais atrativas, funcionários escolheram movimentar seus ganhos por meio das cooperativas como a Sicoob Acre e Sicoob CrediSul.

Desde 2001, um acordo entre governo do estado, Banco do Brasil e cooperativas permite que a Secretaria da Fazenda transfira diretamente os salários dos funcionários para o sistema cooperativo de crédito, sem a necessidade de antes passar pelo BB. Na semana passada, uma reunião entre representantes destes mesmos três setores aconteceu na Secretaria de Gestão Administrativa (SGA).

Agora, o Banco do Brasil quer obrigar estes servidores a reabrirem suas contas na instituição para, antes de repassar os salários para as cooperativas, também gerenciar o dinheiro. Este foi o pedido do banco ao governo; os dirigentes das cooperativas são contra. Com a medida, quase 400 cooperados podem ser afetados, o que representa uma movimentação financeira superior a R$ 1,5 milhão.

Para diretores e gerentes de cooperativas, o Banco do Brasil faz essa pressão por estar vendo diminuir seu número de clientes no estado, o que representa menos lucratividade. Este ano a Prefeitura de Rio Branco encerrou seu convênio com o BB e passou para a Caixa Econômica a folha de pagamento do funcionalismo municipal. Em 2007 a Assembleia Legislativa já tinha feito o mesmo, mas optando pelo Banco da Amazônia.

Estas medidas fizeram o principal banco público do País perder mercado no Acre, onde mantinha hegemonia até bem pouco. O Banco do Brasil passou a gerenciar a folha de pagamento do desde a falência do Banco do Estado do Acre (Banacre), em 1999.

Com essa queda de clientes, o BB se viu obrigado a partir para a briga para retomar lucros -e as cooperativas de crédito se tornaram seu alvo preferencial. Diferente do sistema bancário convencional, no cooperativismo de crédito cada sócio é dono da instituição. Existe prestação de contas de todas as movimentações, e todas as grandes decisões só podem ser tomadas em assembleias. Nelas, o servidor recebe atendimento diferenciado e ágil por também fazer parte do negócio.

O setor é altamente regulamentado pelo Banco Central, o que consolida a base sustentável do sistema cooperativista. Ao final, as sobras –o que seriam os lucros dos bancos – são compartilhadas entre os membros. Em 2015, por exemplo, somente as sobras da Sicoob CrediSul somaram quase R$ 42 milhões.

Taxas de juros são outro diferencial.

Enquanto o sistema Sicoob tem taxa de juro anual em seus cartões de crédito de 183%, no Banco do Brasil ela chega a 427%; já a do cheque especial é de 183%, contra 274%; em abril, a taxa média de crédito pessoal nas cooperativas do Sicoob foi de 2,75%; já no mercado financeiro foi de 3,34%. Os dados fazem parte da análise mensal do Banco Central.

O Sicoob, além do mais, não cobra taxas de manutenção das contas, o que evita transtornos comuns vividos por clientes do sistema bancário que, vez e outra, veem o seu dinheiro desaparecer por conta das cobranças das taxas de serviços e manutenção cobradas.

O sistema cooperativista de crédito vem apresentando resultados positivos nos últimos anos. Ao longo de 2015, o sistema Sicoob apresentou resultado de R$ 2,3 bilhões –um crescimento de 14% em comparação com 2014. Os ativos totais alcançaram a cifra de R$ 57 bilhões entre janeiro e dezembro de 2015, o que representou aumento de quase 19% no comparativo com igual período do ano anterior.

O sistema de crédito cooperativista ganhou destaque em todo o mundo com a crise econômica mundial de 2008 provocada pelo estouro da bolha imobiliária americana. Enquanto grandes bancos dos Estados Unidos faliram ou precisaram ser socorridos pelo governo por conta das especulações em suas operações, as cooperativas de crédito se mostraram consolidadas, passando incólumes pela grande quebradeira do mercado internacional.

É por conta destas diferenças que muitos correntistas do BB estão saindo da instituição e escolhendo uma cooperativa de crédito como a melhor forma de gerenciar seus salários.  
As reportagens da série Profissão jornalista: as demissões em massa nas redações da Amazônia Legal foram produzidas pelos jornalistas Ana Aranda, Andrezza Trajano, Elaíze Farias, Freud Antunes, Keka Werneck, contou com as participações dos repórteres fotográficos Alberto César Araújo, também editor de fotografia, e Odair Leal, e da colaboração do jornalista Fábio Pontes. A coordenação da série foi da jornalista Kátia Brasil. As matérias trazem os infográficos do designer Victor Gabriel com os números das demissões do Caged e dos sindicatos nos estados do Mato Grosso, Amazonas, Acre e Pará. As reportagens serão publicadas ao longo dessa semana.

Clique aqui e veja a série completa 

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Operação Belo Monte


Por Lúcio Flávio Pinto 


No dia 3 de abril, começou a funcionar – ainda em fase pré-operacional – a primeira turbina da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu. Aconteceu pouco mais de cinco anos após o início das obras da usina, projetada para ser a quarta maior do mundo e a maior inteiramente brasileira.

No mesmo dia, o bispo – de origem austríaca – Erwin Kräutler deixou o comando da diocese do Xingu, depois de 50 anos no cargo, por ter atingido a idade limite para o seu exercício, aos 72 anos. Ele foi o mais ativo e destacado opositor do empreendimento.

A coincidência podia ser interpretada como um sinal de que dom Erwin acabou sendo derrotado na sua campanha para impedir a execução do projeto. Exatamente no dia do seu desligamento do bispado, em Altamira, no Pará, a enorme hidrelétrica, a maior obra de infraestrutura (e do PAC, o Programa de Aceleração do Crescimento, o principal do governo do PT), se tornava – literalmente – fato concreto?

A situação é mais complexa do que essa rústica interpretação. A fase executiva ds estudos para o barramento do rio Xingu se iniciou mal entrou em funcionamento, em 1984,  a ainda quarta maior hidrelétrica do mundo, a de Tucuruí, no rio Tocantins, a leste do Xingu, em eixo paralelo. Foi uma das últimas grandes obras inauguradas pelo último dos generais, João Figueiredo, que ocuparam a presidência da república durante o regime militar (1964/1985).

Belo Monte devia ter seguido o mesmo caminho. Quatro barragens rio acima iriam reter água para que, no verão, quando a vazão do rio pode diminuir até 30 vezes em relação ao fluxo de água do pique do inverno, a usina pudesse continuar funcionando, graças à água estocada no período das cheias.

Só o reservatório de uma delas, a de Babaquara, com seis mil quilômetros quadrados, seria duas vezes maior do que o de Tucuruí e superaria o de Sobradinho, o maior lago artificial do Brasil (para se ter uma ideia de grandeza, o famoso lago Paranoá, em Brasília, tem menos de 50 km2).

A grita foi enorme, inclusive no exterior, em particular no Banco Mundial, que se negou a financiar novas hidrelétricas na Amazônia e a endossá-las junto à comunidade financeira internacional. Não por acaso, o BNDES, que garante 85% do custo da usina, com crédito subsidiado, se tornou maior do que o Bird, algo inimaginável pouco tempo atrás, graças à benevolente administração do PT no banco estatal de desenvolvimento, personificada no economista Luciano Coutinho, o intocável.

A Eletronorte, que conduzia Belo Monte depois de se manter à frente de Tucuruí, precisou recuar. Para mudar a fisionomia da nova hidrelétrica, cancelou as demais barragens, garantiu que apenas uma seria mantida no Xingu, justamente a de Belo Monte (ex-Kararaô), e apresentou um novo desenho do projeto, inédito e audacioso.

A empresa recorreu ao máximo de criatividade e audácia em matéria de engenharia para manter o propósito de aproveitar a excepcional condição geográfica de um trecho, conhecida por a Volta Grande, em que o rio faz uma grande curva e, em 100 quilômetros, desce 90 metros. É uma declividade natural superior – em 20 metros – aos 70 metros que foram alteados no Tocantins para dar-lhe volume e força constantes para acionar as imensas 23 turbinas da sua casa de força, cada uma delas precisando de 500 mil litros de água por segundo.

O problema é que, para atender a pressão de ambientalistas, antropólogos, ONGs e a comunidade mundial, o reservatório que sobreviveu seria pequeno demais (pouco mais de 10% do tamanho do lago de Tucuruí) para garantir que no verão houvesse água suficiente para mover as 18 turbinas (maiores do que as de Tucuruí) lá embaixo.

Também não podia ser usada a vazão natural do rio, por sua calha, porque a sucessão de curvas e a presença de ilhas no seu leito tiram a velocidade necessária das águas. Com ousada concepção, a solução foi desviar a água retida no vertedouro principal, distante 100 quilômetros da casa de força principal, por canais naturais e artificiais que agora levam a água pelo declive de 90 metros a uma velocidade compatível com o tamanho das unidades de geração.

Não há nada igual nos anais das hidrelétricas no Brasil e no mundo. Os engenheiros tiveram que recorrer a uma concepção de vanguarda para que não houvesse grande inundação a montante (acima) da barragem (submergindo  área muito maior de Altamira), o rio a jusante (abaixo) não tivesse redução artificial de fluxo (a Norte Energia se comprometeu a manter vazão de 700 metros cúbicos de água por segundo no pique da estiagem, volume maior do que a descarga natural do Xingu nesse período), e fazer o desvio, saindo do leito do rio, para a adução de água em volume e velocidade de motorização no nível exigido.

Veja artigo completo em Amazônia Real

terça-feira, 3 de maio de 2016

Busca perdida

Polícia Militar encerra sem sucesso buscas aos garimpeiros sumidos na reserva Uatumã

Andrezza Trajano, Amazônia Real 

O tenente Paulo Sérgio Cordeiro, da Companhia Independente de Policiamento com Cães (Cipcães), disse à agência Amazônia Real que a Polícia Militar do Amazonas encerrou as buscas aos nove garimpeiros desparecidos há mais de cinco meses dentro da Reserva Biológica de Uatumã, que fica no município de Presidente Figueiredo (AM), a 107 quilômetros de Manaus. A terceira operação de buscas ao grupo terminou sem resultados, assim como aconteceu em outras duas ações anteriores.

Segundo o tenente Paulo Sérgio Cordeiro, a operação aconteceu de 24 de março a 1º. de abril e contou com as participações de cinco soldados da PM, dois operadores de rádio, quatro pilotos e um servidor do Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, responsável pela gestão da reserva Uatumã, além de três cães, sendo dois de busca e um de guarda.

“As buscas foram encerradas. Mas se a Polícia Civil nos indicar uma nova pista, em um lugar por onde não tenhamos passado, voltamos lá”, afirmou o tenente Paulo Sérgio Cordeiro.

O desaparecimento dos nove garimpeiros, entre eles uma mulher, foi registrado no dia 8 de novembro de 2015. A Polícia Civil do Amazonas diz que o grupo entrou para garimpar ouro ilegalmente dentro da reserva Uatumã.

De acordo com a Polícia Civil, os garimpeiros desaparecidos são: José Helenilton Moura Alves, 51 anos, Afonso Pereira de Souza, 26 anos, Emerson Neves Nascimento, 19 anos, Luiz Ferreira dos Santos, 54 anos, Ivanildo Marques dos Santos, 39 anos, Lucas Santos de Souza, 18 anos, Jolar André Broch, 53 anos, João Batista Sobrinho – idade não informada – e Cristiane Batista Barbosa, 18 anos.

O delegado Valdinei Silva, da 37ª Delegacia Interativa de Polícia Civil de Presidente Figueiredo, que coordena as investigações e relatou o inquérito à Justiça, apresentou duas suspeitas para o sumiço do grupo: crime relacionado à exploração ilegal de ouro ou um acidente. Uma terceira suspeita, um possível ataque por índios isolados, foi descartada. Silva anunciou o final das buscas pela Civil em janeiro deste ano.

Procurados pela Amazônia Real, os familiares disseram que não aceitam o final das buscas pela polícia e vão continuar a fazer uma investigação paralela. “São nove pessoas desaparecidas, nossas famílias estão desesperadas. As autoridades não podem esquecer esse caso”, disse à reportagem Cleonice Santos, 59 anos, mulher do pescador Luiz Ferreira dos Santos, um dos desaparecidos.

Além do marido de Cleonice Santos, estão desaparecidos mais dois familiares: o sobrinho Emerson Neves Nascimento e José Helenilton Moura Alves, casado com uma sobrinha dela.

Pai de Emerson e sogro de José Helenilton, o aposentado Adelson dos Santos Nascimento, 63 anos, disse nas três vezes que esteve na Reserva Biológica de Uatumã a procura de seus familiares também não obteve sucesso, mas vai continuar a procurá-los.

“Estamos tristes, a gente não teve resposta nenhuma [das autoridades]. Vamos continuar procurando, vamos buscar a verdade. Meu filho está lá, outras pessoas da família também, além de outras pessoas, não podemos deixar do jeito que está. Quero a verdade”, disse.

Nascimento contou que está arrecadando dinheiro para voltar à reserva. “A polícia diz que já fez o dever dela, então agora somos nós da família que vamos seguir com as buscas”, disse, sem informar quando vai retornar ao local onde desapareceram os nove garimpeiros.


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