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sábado, 9 de maio de 2015

A fogueira dos ateus e dos cristãos


O Acre que vai caminhando perigosamente para se transformar numa “república dos pastores” vive nos últimos dias o dilema de um jovem dito ateu ter queimado a Bíblia durante um sarau no campus da Universidade Federal do Acre (Ufac). O episódio provocou a fúria no fundamentalismo religioso; as declarações são as mais variadas: desde que o evento representa a “intolerância religiosa”, até a acusação de que o vocalista da banda de rock é um enviado dos infernos.

Todo este episódio revela que a intolerância religiosa está muito mais presente entre os evangélicos do que entre os ateus e agnósticos. (Até o momento não se viu a mesma reação exacerbada dos católicos). Moramos numa República Federativa regida por uma Constituição escrita após 20 anos de um regime ditatorial, cujas manifestações contrárias ao governo eram reprimidas com torturas e prisões.

Esta Constituição assegura a todos os quase 200 milhões de brasileiros a liberdade religiosa –e a liberdade de não ter religião. A qualquer brasileiro é facultado o direito de queimar a Bíblia, o Alcorão, a Torá, e tantos outros livros apontados como sagrados pelas respectivas religiões. A nossa “sagrada Constituição” também possibilita a todo cristão o direito de queimar a literatura ateia.

Todo pastor ou padre pode queimar, por exemplo, a divina obra do evolucionismo: “A Origem das Espécies”, de Charles Darwin, que coloca por terra a teoria criacionista do Gênesis. Portanto, a reação de líderes evangélicos é desproporcional para quem quer morar em um Estado democrático de direito, regido por uma Constituição que assegura a plena liberdade aos seus cidadãos.

Chegamos a este modelo de “civilização” após séculos de intolerância religiosa dos cristãos da igreja católica que, além de livros tidos como pagãos, mandava para a fogueira em praça pública homens e mulheres que ousassem contestar seus dogmas. Assusta-me que lideranças religiosas no Acre tentem nos levar de volta ao sombrio período da idade das trevas. 

E o mais tenebroso é ver um governo republicano ceder a caprichos destes mesmos líderes. Tião Viana ficou como que na guilhotina por pastores, e obrigado a emitir nota repudiando a queima da Bíblia. Tião Viana representa o Estado, e o Estado é laico; sua postura, portanto, não é a de um estadista, mas de um simples político com medo de perder os votos daqueles que, como há 2.000 anos, transformaram o templo sagrado numa “casa de mercadores”, e foram expulsos a chicote pelo maior líder pacífico da História: Jesus Cristo, o pregador da tolerância.


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