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quinta-feira, 28 de agosto de 2014

A Poeta e a seringueira

Um dos pontos altos da participação de Marina Silva (PSB) no “Jornal Nacional” desta quarta (27) foi a pertinente pergunta de Patrícia Poeta sobre o fato da presidenciável, na disputa de 2010, ter ficado em terceiro lugar em sua terra natal. Quatro anos atrás, Marina perdeu de goleada para o paulista José Serra (PSDB), que nunca antes tinha posto seus pés em solo acreano –ou acriano, como bem entender.

A observação é lógica: como pode ela ter obtido este resultado onde nasceu e consolidou sua trajetória política, começando como vereadora de Rio Branco, depois deputada estadual e, enfim, senadora. Este resultado negativo em 2010 seria uma reprovação dos acreanos à atuação dela em 20 anos de mandatos pelo Estado?

Como bem ressaltou Patrícia Poeta, é natural que um candidato a presidente da República tenha pelo menos uma boa votação em seu reduto eleitoral. Seria como Aécio Neves (PSDB) ficar atrás de Marina ou Dilma Rousseff (PT) em Minas Gerais, ou o mesmo com o falecido Eduardo Campos (PSB) em Pernambuco.

A resposta foi natural tanto quanto a pergunta: “santo de casa não faz milagre”. Mas isso por si só não explica o vexame de Marina no Acre. Ela ainda falou sobre estruturas pesadas do PT e PSDB em torno de seus candidatos ao Planalto, enquanto o nanico PV penava para colocar sua campanha na rua.

Isso também não justifica o terceiro lugar: num Estado pequeno cujo eleitorado não chega a 1% de participação nacional, a corrida presidencial tem influência quase zero. Se José Serra fosse depender da organização e estrutura dos tucanos no Acre, ele poderia ter dividido a última posição com Plínio de Arruda (Psol).

O acreano votou em massa no ex-governador paulista porque não queria Dilma Rousseff (PT), resultado do cansaço de até então 12 anos de governo petista, e por ainda ver na testa de Marina a estrelinha vermelha do PT. O modo quase ditatorial do PT governar o Acre fez a população chegar a níveis recordes de rejeição ao partido, e Marina ainda era vista como uma boa militante petista pelo acreano.

Em um Estado pobre (em todos os sentidos) como o Acre a atuação macropolítica de Marina Silva não lhe renderia bons dividendos eleitorais. Por aqui o que rende a aprovação popular, infelizmente, é a velha política do assistencialismo. A compra de votos é uma praga institucionalizada que nos faz ter uma das piores representações na Assembleia Legislativa, nas Câmaras e nos governos.

Debater questões como meio ambiente, sustentabilidade, compromissos com o tripé macroeconômico e royalties do pré-sal leva o político a ser apedrejado em praça pública. Não que este seja o comportamento de toda a sociedade, mas de uma maioria que ainda vive na pobreza, com uma educação pública de péssima qualidade.

Nossa política é muito provinciana. Aqui o eleitor deixa de votar num bom candidato só pelo fato de que “ele nunca passou aqui em casa, nunca falou comigo”. Marina também era criticada por ter “abandonado” sua terra natal. “Ela nem pisa mais aqui”, ouvia-se nas ruas. O cargo de ministra do Meio Ambiente a afastou de sua base, o que resultou na rejeição num eleitorado bairrista.

Políticos com a qualificação intelectual da ex-senadora têm “vida curta”. Perpetuam-se no poder aqueles que instrumentalizam a compra de voto e mantêm um assistencialismo eficiente capaz de render votos.

Nossa origem nordestina da política do cabresto e do coronelismo ainda está enraizada na sociedade acreana do século 21. Hoje temos uma versão moderna dos coronéis de barranco, como ficaram conhecidos os donos dos grandes seringais do século passado.

Mas há momentos em que o povo decide se livrar das amarras e mandar seus coronéis –seja da direita ou da esquerda - para bem longe, como foi em 2010.  Por muito pouco o PT não saiu derrotado das eleições para o governo, e perdeu uma das duas cadeiras do Senado –ocupada por Marina Silva.

A própria eleição da ambientalista para o Senado em 1994 foi um momento de revolta do eleitor, fadigado da hegemonia do PMDB. Mesmo com todos estes fatores contrários, o acreano tem tido a capacidade de buscar o equilíbrio no poder, não deixando que um único partido tenha toda a concentração.

Em meio a tudo isso, o acreano vai construindo sua história política. Por aqui se diz que não há povo mais politizado do que o acreano (tenho minhas dúvidas). Em meio à pobreza social e econômica em que estão mergulhados, nossos cidadãos tiveram a capacidade de revelar ao mundo figuras como Chico Mendes e Marina Silva, também frutos desta mesma “miséria social” em que a Amazônia está submersa.

Que a biografia da presidenciável, alfabetizada aos 16 anos de idade, sirva de inspiração ao nosso povo para quem sabe, um dia, possamos sair deste oceano verde de miséria social, econômica e educacional.  

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