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segunda-feira, 4 de julho de 2022

Consolidação da destruição

 “Governantes do Acre querem destruir a história de Chico Mendes”, diz filha do líder seringueiro 

 

Atacada por vândalos, estátua de Chico Mendes fica jogada no centro da cidade (Foto: Juan Diaz)

 

A estátua do líder seringueiro Chico Mendes foi arrancada da base e  jogada ao chão da Praça Povos da Floresta na sexta-feira (1º), no centro de Rio Branco (AC). A cena de vandalismo contra o patrimônio público representa o desrespeito à história do Acre e também a consolidação do desmonte da política de proteção da Amazônia promovida pelo governador bolsonarista Gladson Cameli (Progressistas). Essa é a análise feita pela coordenadora do Comitê Chico Mendes e filha do ambientalista, Ângela Mendes.

Além da estátua, a casa em madeira onde Chico Mendes viveu e foi assassinado, em 1988, na cidade de Xapuri, sofre com o abandono e a deterioração desde a chegada de Cameli ao governo do Acre, em 2019.

Para Ângela Mendes, há uma clara tentativa dos atuais governantes acreanos de destruir toda a história de vida e de luta protagonizada por seu pai e outros seringueiros em defesa da floresta na década de 1980. Até mesmo manifestações artísticas com representações de Chico Mendes foram censuradas pelo governo Cameli. Foi o caso de um grafite com a representação de seu rosto feito numa das paredes do Mercado dos Colonos, a poucos metros de onde ficava a estátua. A arte foi apagada de forma arbitrária, com  tinta azul.

“Desde que assumiu, o governo caminha de acordo com os interesses do agronegócio, dos grandes fazendeiros. Isso consolida o descaso do governo com a nossa cultura, com a nossa história, com a memória de toda essa luta dos povos da floresta, liderada pelo meu pai e que repercutiu em todo o mundo”, afirma Ângela.

Testemunha das mobilizações políticas organizadas por Chico Mendes, o ex-presidente Luíz Inácio Lula da Silva (PT) se manifestou sobre o episódio da destruição da estátua do líder seringueiro. “Assassinaram Chico Mendes e isso não matou suas ideias. Os que vandalizaram sua estátua em Rio Branco também tentam apagar a sua memória, mas também não terão sucesso”, escreveu o petista no Twitter.

Como destaca a filha, Chico Mendes é o nome do Acre mais conhecido no Brasil e exterior, um símbolo mundial em defesa das causas ambientais. “Os três governos, nas três esferas, estão alinhados no projeto de desmonte não só da política ambiental, mas também de tudo aquilo que o meu pai representou para essa política de meio ambiente, para que o Brasil fosse, em tempos passados, referência nesta pauta ambiental”, ressalta Ângela.

Na análise dela, enquanto o governo federal de Jair Bolsonaro (PL) atua para destruir a política de proteção ambiental do país, no plano local os governos estadual e municipal trabalham em conjunto para destruir a história e o legado de Chico Mendes. “Hoje nós entendemos, mais do que nunca, que isso faz parte de um projeto. A destruição da estátua do meu pai pode até ter sido um ato de vandalismo, mas acima de tudo ela está  inserida dentro desse projeto de apagar a história que ele representa”, ressalta.

Instalada no coração da capital acreana desde 2003, a estátua de Chico Mendes foi esculpida no tamanho real do homenageado e já vinha sofrendo com o descaso há algum tempo. A homenagem original era do líder seringueiro de mãos dadas com seu filho pequeno. A estátua da criança foi roubada e nunca recuperada. O governo também não colocou outra no lugar. Desta vez, a imagem do líder seringueiro foi a vítima, ficando o fim de semana todo abandonada no chão aos olhos de todos.

Na noite de domingo (3), um protesto liderado por Ângela foi organizado no local. Com velas e cartazes, os manifestantes pediram para que o monumento fosse restaurado e devolvido ao lugar. A Praça Povos da Floresta está localizada em frente ao Palácio Rio Branco, sede do governo acreano, e ao lado da Assembleia Legislativa. Tanto a praça como a estátua foram construídas durante o chamado “governo da floresta” (1999-2006), liderado pelo petista Jorge Viana.   

Após 20 anos de gestões do PT no Acre – partido que teve como um dos fundadores justamente Chico Mendes – o bolsonarismo tomou conta das urnas no processo eleitoral de 2018. Dessa forma, a direita acreana, que detinha a hegemonia política do estado na época do assassinato de líderes seringueiros como Chico Mendes e Wilson Pinheiro, voltou aos espaços de comando com “novas caras”, representadas por Gladson Cameli, cujo tio, Orleir Cameli, já havia sido governador entre 1995 e 1998.  


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