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sábado, 23 de julho de 2022

Os custos políticos de Cameli

Cameli quer rifar a família Bittar; atitude é um desastre político e pode ficar ainda mais isolado



Após ter sido obrigado a aceitar, goela abaixo, o nome de Márcia Espinosa Bittar (PL) como sua pré-candidata a vice na chapa de reeleição, o governador do Acre, Gladson Cameli (Progressistas), trabalha para rifar a esposa (ou ex-esposa) do todo-poderoso senador bolsonarista Márcio Bittar (União Brasil). Conforme relatou o jornalista Luiz Carlos Moreira Jorge, o Crica, Gladson o teria dito, com todas as letras, que Márcia Bittar não será mais sua candidata a vice, e que ninguém o colocará contra a parede.


Desde o começo já se sabia da insatisfação do governador em ter a nada carismática e agregadora Márcia Bittar como sua parceira de chapa majoritária. Todos os aliados torceram o nariz para a dobradinha Cameli-Bittar. Sabem que o nome de um Bittar mais tira votos do que soma. Nem mesmo o apelo à imagem do bolsonarismo ainda tão forte no Acre reduz essa rejeição. Agora, é certo  que esse pé na bunda dado pelo governador - caso realmente se concretize - após toda a festa feita para oficializar a aliança, seria uma grande humilhação para os Bittar.    

Mesmo sendo desagregador, Márcio Bittar tem um forte mandato de senador em Brasília - isso enquanto o bolsonarismo resiste por lá. Como apontam todas as pesquisas, a partir de 2023 o Palácio do Planalto terá um novo-velho ocupante: Luíz Inácio Lula da Silva. Isso só não vai acontecer se Jair Bolsonaro conseguir uma reviravolta ante o amplo favoritismo de Lula ou der um golpe de Estado, sendo a segunda opção a mais provável de acontecer, já que todos os dias o presidente faz ataques contra a democracia.

Além de ainda carregar o bolsonarismo no Acre a galope, Márcio Bittar controla o União Brasil, partido que detém a maior fatia do fundo partidário e muitos minutos de espaço na propaganda eleitoral. É no União Brasil onde também está o deputado federal Alan Rick, rifado, até aqui, por Gladson Cameli na corrida para o Senado. Sem força nem habilidade política, o governador se vê obrigado a abraçar a candidatura natimorta de sua suplente no Senado, Mailza Gomes (Progressistas).

Como escrevi no artigo anterior, Gladson Cameli chega às eleições de 2022 com a aliança partidária de 2018 espatifada. Nestes três anos e meio à frente do Executivo, foi incapaz de manter a unidade de seu grupo político. Agora paga um alto preço por sua arrogância disfarçada de humildade. O governador ainda é o favorito nas sondagens de intenção de voto. Apesar do desgoverno desastroso que faz,  é bem avaliado pelo eleitorado. Seu carisma é inegável, tendo a capacidade de ofuscar todos os defeitos.

Apesar de (ainda) ser forte eleitoralmente, Cameli está muito enfraquecido politicamente. E como sabemos, ninguém ganha uma eleição sozinho, e cada eleição é uma eleição. Se quatro anos atrás ele seria capaz de derrotar todos os adversários já no primeiro turno sem o apoio de ninguém - como costumava vangloriar - a situação hoje é bastante diferente. Ele agora é governador de Estado que tenta a reeleição, e será a vidraça principal de todos os adversários. Tem muitas explicações a dar ao eleitorado.

Além da incompetência na administração pública, o atual governador foi atingido em cheio por gravíssimas denúncias de corrupção reveladas por meio da operação Ptolomeu, da Polícia Federal. É claro que todos estes pontos vão ser amplamente explorados pelos oponentes. Gladson Cameli se verá atacado por ex-aliados como o MDB, com a provável candidatura da deputada federal Mara Rocha, e o PSD do senador Sérgio Petecão (também candidato), que em 2018 fizeram campanha para ele. Ambos os partidos são donos de uma ampla exposição no tempo de rádio e TV.

Os caciques destes dois partidos já deram declarações públicas afirmando que, num eventual segundo turno entre Gladson Cameli e Jorge Viana (PT), estarão no palanque do petista, e não do governador, revelando o grau de ranhura que ficou na relação deles. Nem mesmo o poder do cargo de governador tem se mostrado - até agora - capaz de reagrupar as forças políticas que lhe renderam a vitória há quatro anos.  

A Gladson Cameli só lhe restou o apoio do clã Bittar, que mais atrapalha do que ajuda. Para tentar se livrar da pedra no sapato que é ter Márcia Bittar como vice, o governador também pode perder mais este importante apoio, do União Brasil e da família Bolsonaro - que está numa tentativa desesperada de se assegurar no Planalto.

Como se pode ver, o governador acreano está numa situação política delicadíssima; entre a cruz e a espada. Situação esta provocada por ele próprio e sua arrogância de desprezar aliados, achando que apenas seu sorriso maroto e os passos de dançarino asseguram votos nas urnas.

Agora ele vê que o buraco é mais embaixo. Após perder o apoio de aliados tão importantes, sabe que não poderá chutar de forma rasteira a família Bittar. E o preço já foi dito: a candidatura de vice. Ou aceita, ou pulam fora, com a possibilidade de Gladson ter mais um adversário na corrida pelo Palácio Rio Branco: o senador Márcio Bittar, apresentando-se como o candidato oficial de Bolsonaro no Acre.

Nos bastidores se diz que a relação dos Bittar com Cameli, que não era lá já essas coisas, ficou ainda pior diante das articulações subterrâneas para rifar o nome de Márcia Bittar. O estrago está feito, e não sabemos as consequências. A disputa está apenas no começo.     


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