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domingo, 1 de setembro de 2019

Os fatos e os fatos

Em 2019, queimadas no Acre estão 23% maiores do que em 2016, ano de El Niño 


Queimada registrada no sábado (24) na zona rural do município de Bujari (Foto: Fabio Pontes) 


O discurso de parte das autoridades ambientais do Acre de que o boom no número de queimadas se deu por conta de um período mais longo sem chuvas não tem base científica. Quando se comparado com 2016 - ano em que o Acre enfrentou um dos El Niños mais severos das últimas décadas - a quantidade de focos de queimadas em 2019 está 23% superior.

É o que aponta nota técnica elaborada pelo Instituto de Pesquisas Ambiental da Amazônia (Ipam) divulgado essa semana. Em cotejo com o ano passado, as queimadas registradas no território acreano estão 57% maiores. O estudo leva em consideração o período entre 1o de janeiro e 14 de agosto dos três anos avaliados.

O estudo científico concluiu que o Acre, em 2019, não sofre com um período seco severo como o de 2016. Há três anos, quando um El Niño influenciava o clima no sul da Amazônia, o Acre foi um dos estados mais atingidos. O principal efeito, contudo, deu-se na seca do rio Acre, que levou as autoridades a racionalizar o fornecimento de água potável.

O manancial é a principal fonte de abastecimento para os mais de 400 mil habitantes da capital Rio Branco. Este ano o rio também está numa situação crítica, mas as chuvas dos últimos dias acabaram elevando um pouco seu nível.

Segundo o estudo do Ipam, o aumento das queimadas está ligado diretamente ao do desmatamento.  De acordo com Boletim do Desmatamento de agosto elaborado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), em julho o Acre teve desmatado 187 quilômetros quadrados de floresta nativa; no mesmo mês do ano passado, essa área foi de 35 km2 – uma variação de 434%.

A pesquisa do Ipam não levou em consideração as questões políticas locais, mas é fato que as posturas do governo federal e local contribuíram para o Acre chamar a atenção do Brasil e do mundo pelo aumento das queimadas e do desmatamento.

Defensor do agronegócio como carro-chefe da economia acreana, o governador Gladson Cameli (PP) desautorizou pessoas autuadas pelo Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac) a pagar as multas, dizendo que agora quem mandava era ele.  (Leia o artigo As falas (não ecológicas) de Cameli)

As queimadas rurais causam danos não apenas do ponto de vista ambiental, mas também da saúde humana. Segundo o Ipam, quatro cidades acreanas - Rio Branco, Sena madureira, Assis Brasil e Manoel Urbano - registraram concentração de material particulado no ar acima do recomendado pela Organização Mundial de Saúde. A qualidade do ar respirado nestes municípios ficou pior do que a de São Paulo, por exemplo. 


Recomendações 

O estudo do Ipam aponta que a solução mais eficaz para se controlar as queimadas é o combate ao desmatamento. “Considerando que o desmatamento é vetor direto de incêndios florestais e queimada, é preciso intensificar o combate à derrubada ilegal da floresta e apoiar agricultores para que deixem de usar o fogo no preparo da terra”, diz a nota técnica.

“Por fim, cabe o alerta de que o cenário atual, de elevado número de focos de incêndios no rastro do desmatamento, poderá ser “lugar comum” na Amazônia, num futuro onde a floresta ceda espaço para outros usos da terra. É fundamental que se entenda que, sem grandes extensões de florestas atuando como barreira à propagação do fogo, os prejuízos futuros para a saúde das pessoas e da agricultura podem ser incalculáveis.” 


 

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