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quarta-feira, 22 de junho de 2016

"Animalzinho" morto


Exército tenta minimizar morte do “animalzinho” Juma e sua participação no evento da tocha

Por Fábio Pontes
       Kátia Brasil 
       Elaíze Farias, da Amazônia Real


(Foto: Jair Araújo/D24
O Exército minimizou a repercussão internacional provocada pela morte da onça-pintada Juma, que aconteceu dentro das instalações do Zoológico do Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), em Manaus. Também tentou desvincular a presença do animal em risco de extinção na cerimônia do Revezamento da Tocha Olímpica Rio 2016.

Em entrevista exclusiva à agência Amazônia Real, o chefe da 5ª Seção de Comunicação Social do Comando Militar da Amazônia (CMA) do Exército, coronel Luiz Gustavo Evelyn, disse que o “animalzinho” precisou ser sacrificado por ter colocado em risco a vida de um oficial veterinário. A onça foi morta na segunda-feira (20) com um tiro de pistola, depois da cerimônia olímpica.

“O fato em si nada tem a ver com a Tocha [Olímpica]. Aconteceu o evento e, posteriormente, dentro do Zoológico do CIGS, num procedimento corriqueiro, na transferência do animal de um ambiente para o outro, ele veio a se evadir. Neste momento estavam presentes dois veterinários e três tratadores, como de costume. Foi feito todo o procedimento protocolar de captura, com a utilização de dardo tranquilizante, mas foi ineficaz. Para preservar a integridade física do veterinário o animal foi detido. Ela avançou no veterinário e aí o animalzinho foi detido [morto]”, afirmou o coronel Evelyn.

Da espécie Panthera onca, que está em risco de extinção, Juma era um macho de 9 anos de idade e vivia nas instalações do 1° Batalhão de Infantaria de Selva do Exército, para onde seria transferida após o evento da Tocha Olímpica. Durante a cerimônia o animal silvestre foi exposto e “interagiu” com participantes do revezamento realizado dentro do zoológico. Muitos participantes posaram para fotografias ao lado dele.

Conforme publicou a Amazônia Real, o Exército não recebeu autorização do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) para deslocar da jaula e exibir o animal na cerimônia. O Comando Militar da Amazônia foi notificado. Segundo o Ipaam, o animal autorizado foi apenas a onça Simba, que é também macho. Os dois foram expostos no evento. Estavam acorrentados e sob cuidados de instrutores militares, chamados de “onceiros”.

O Comitê Rio 2016 confirmou a participação da onça-pintada Juma na cerimônia do Revezamento da Tocha Olímpica. Em sua página oficial no Facebook, a organização dos Jogos Olímpicos e Paralimpicos reconheceu o erro de permitir a exibição do animal no evento.

“Erramos ao permitir que a Tocha Olímpica, símbolo da paz e da união entre os povos, fosse exibida ao lado de um animal selvagem acorrentado. Essa cena contraria nossas crenças e valores. Estamos muito tristes com o desfecho que se deu após a passagem da tocha. Garantimos que não veremos mais situações assim nos Jogos Rio 2016”, diz.

A Amazônia Real procurou a assessoria de imprensa do Comitê Rio 2016 para saber se a organização não questionou a presença de animais silvestres na cerimônia da Tocha Olímpica, que contou com a presença de cerca de 30 pessoas no CIGS. “A onça é símbolo do CIGS. Quando o revezamento chegou ao centro ela já estava lá. Como dissemos, erramos ao permitir que a Tocha Olímpica fosse exibida ao lado de um animal selvagem acorrentado”, declarou o comitê.

Na nota divulgada ontem (20), o Exército disse que a onça-pintada foi morta com o tiro de pistola porque “deslocou-se em direção ao militar”. “O procedimento de captura foi realizado com disparo de tranquilizantes. O animal, mesmo atingido, deslocou-se na direção de um militar que estava no local. Como procedimento de segurança, visando a proteger a integridade física do militar e da equipe de tratadores, foi realizado um tiro de pistola no animal, que veio a falecer. ”

Os termos “avançar” em direção ao oficial veterinário, como diz o coronel Luiz Gustavo Evelyn, e “deslocou-se” como informou oficialmente o Exército em nota distribuída à imprensa, têm relevância para a Comissão de Meio Ambiente da Ordem de Advogados do Brasil (OAB), seccional do Amazonas, que vai investigar possível crime ambiental no caso.

À Amazônia Real, o presidente da comissão, Vanylton dos Santos, disse que vai solicitar nesta quarta-feira (22) ao Comando Militar da Amazônia esclarecimento sobre as circunstâncias da morte da onça-pintada Juma. O pedido, segundo ele, tem que ser protocolado oficialmente na unidade do Exército.

“Avançar, deslocou-se, não é atacar. Avançar é a eminência do ataque, então é possível, dependendo da apuração dos fatos, que seja desconstituído o crime ambiental ou não. De qualquer forma, será apurada a responsabilidade administrativa, ou seja, a questão da licença ambiental do Ipaam, e, principalmente, a responsabilidade civil, a questão do dano moral de ter abatido um patrimônio da floresta amazônica. Aquela onça não era apenas um animal, mas um símbolo da região amazônica”, disse o advogado Vanylton dos Santos.


O que diz o Exército? 
O chefe da 5º Seção de Comunicação Social do CMA, coronel Luiz Gustavo Evelyn, disse que a participação da onça Juma na cerimônia do Revezamento da Tocha Olímpica Rio 2016 dentro do Zoológico do CGS foi uma “coincidência” por estar no percurso da tocha. “Ela estava no evento. Se você observar tinha dois animais lá, duas onças. A Simba, mascote do CIGS que efetivamente participou, e ela [Juma] estava interior no zoológico e por uma coincidência ela estava no percurso da tocha. Então ela participou e você tem até fotos dela lá que foram tiradas durante o evento”, afirmou o militar.

Segundo o coronel Evelyn, o animal que de fato tinha sido escolhido e preparado para a festa foi Simba, do CIGS. O Ipaam diz que este animal tinha autorização para ser exibido, mas Juma não estava licenciado.

Sobre a participação de onças em eventos públicos, o coronel Evelyn disse que “essa participação em formaturas e tudo se dá por ser um animal símbolo do nosso do Comando Militar da Amazônia. O símbolo é a onça, então essa participação ela é corriqueira e efetiva”.

Ele disse que a onça Juma foi entregue ao 1º BIS em 2009, com dois anos de idade, pelo Ibama. Ele era tratado pela equipe de zootecnia do batalhão, que é responsável pelo tratamento de todas as onças do Exército em Manaus. Juma era um animal classificado como de temperamento dócil.

Maior mamífero terrestre da Amazônia, a onça-pintada tem sua imagem presente em quase todos os escudos das unidades do Exército na região. Em Manaus, os principais quartéis dispõem de uma onça como mascote. São sete animais, ao todo, sob responsabilidade da força. O próprio CMA possui duas onças: Jiquitaia e Aru. Os animais participam de cerimônias como a troca de comando, formaturas e visitas de autoridades.

“Nós somos mantenedores desses animais que nos são trazidos pelo Ibama, que os apreendem com caçadores e nos entrega. Essa participação em formaturas se dá por ser um animal símbolo do Comando Militar da Amazônia, ela é corriqueira e se dá há vários e vários anos”, disse o coronel Evelyn.

Questionado sobre as medidas adotadas para garantir a segurança do público e do próprio animal no evento da Tocha Olímpica, o coronel Evelyn explicou que há um procedimento padrão com a presença de veterinários e tratadores, que prendem a onça por coleiras e correntes, além dos dardos tranquilizantes que são usados em caso de necessidade.

“Com relação se ela estava amparada pelo Ipaam naquele exato momento para participar do evento é o que apuramos. Como eu disse, ela não era partícipe principal do evento, ela estava no evento. Com relação a essa efetiva autorização, isso está sendo levantado e para isso foi instaurado o procedimento administrativo”, disse o coronel.

Perguntado se o CMA pede a devida autorização do órgão ambiental do estado para todas as exposições das onças, o oficial falou que o “Exército trabalha com base em três pilares: legalidade, estabilidade e legitimidade”, disse o chefe da Seção.

De acordo com o coronel Luiz Gustavo Evelyn, o Exército não mudará sua política de tratamento com as onças. “Não há como ter controle maior se o maior já existe. Nós sempre vamos manter este cuidado que já ocorre naturalmente. O que aconteceu foi uma fatalidade, e que está sujeito a quem lida com este tipo de animal”, afirmou o militar.

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