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sexta-feira, 20 de maio de 2022

Rondônia Devastada

 O último seringueiro 

A história de quem resiste em UC devastada pela grilagem

 

 

Almir Chaves: a face da resistência ao roubo de terras públicas em RO (Foto:Alexandre Noronha/Amazônia Real)

 

Ao navegar pelo rio Jaci-Paraná, a impressão é a de que toda a região encontra-se bastante preservada pela densa floresta nas duas margens. E está igualmente inabitada, ao contrário de outras partes da Amazônia onde sempre é possível encontrar um ribeirinho navegando pelos mananciais. Procurar o último morador da Reserva Extrativista (Resex) Jaci-Paraná, o seringueiro Almir Chaves de Melo, é o desafio a que se impõe a reportagem da agência Amazônia Real. É ele quem pode mostrar que a histórica luta pela preservação é pura ilusão: basta adentrar um pouco pela mata e só se veem fazendas. E que no lugar dos extrativistas, que partiram ou foram expulsos, estão os invasores.

Para se chegar tanto por via fluvial como terrestre à Resex e à Terra Indígena Karipuna, o ponto de partida é o distrito de Jaci-Paraná, a 80 quilômetros de Porto Velho pela BR-364. Por estar no caminho para a capital do Acre, Rio Branco, Jaci-Paraná tem um movimento intenso de veículos pesados. A presença das grandes propriedades de gado e soja fazem o vilarejo respirar o agronegócio. Um outdoor recepciona os visitantes. “Jaci-Paraná – RO apoia o presidente Jair Bolsonaro. Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, lê-se no anúncio. A propaganda é quase onipresente pelas rodovias que cruzam Rondônia.

Embarcar em uma voadeira, a partir de um flutuante às margens do Jaci-Paraná, confere, por algum tempo, a sensação de deixar para trás um ambiente carregado. Em Rondônia, movimentos sociais, indígenas e ambientalistas são marginalizados, perseguidos e acusados de travar o desenvolvimento. E a lógica da destruição, histórica, ganhou no bolsonarismo a sua expressão máxima. Eles estão presentes nessas áreas que deveriam ser preservadas em Rondônia.

A Resex Jaci-Paraná foi uma das que mais perderam cobertura florestal entre as Unidades de Conservação (UCs) na Amazônia brasileira. Em 2021, essa Resex apresentava uma perda de mais de 80% de cobertura florestal, tendo parte de sua floresta já sido convertida em pastagem. Só em outubro do ano passado foram registrados 206 focos de incêndio na Resex Jaci-Paraná, segundo dados do Projeto Queimadas/Inpe.

Após três horas subindo o rio numa manhã chuvosa, chega-se à colocação do último seringueiro da Resex Jaci-Paraná. A única pista de sua localização era procurá-lo na primeira casa após as “Três Meninas”, como é chamado o ponto de encontro entre um trio de ilhas no rio Jaci-Paraná. O vazio populacional dessa região se explica tanto pela expulsão dos extrativistas pela invasão da UC, quanto pela construção das usinas hidrelétricas do rio Madeira. O encontro do Jaci-Paraná com o Madeira se tornou uma espécie de grande lago represado, onde gigantescas torres de transmissão de energia parecem flutuar. Muitas famílias tiveram que ser reassentadas porque suas áreas foram inundadas.

As canoas estacionadas às margens do barranco são o sinal da presença humana naquelas margens do Jaci-Paraná. Do rio, avista-se numa terra mais alta a casa de madeira do último seringueiro morador da reserva extrativista. A residência afastada das margens é a estratégia dos ribeirinhos da Amazônia para escapar das cheias anuais. 


Leia a reportagem especial Rondônia Devastada na Amazônia Real

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