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sexta-feira, 19 de abril de 2019

Dia do Índio. Dia de luta

Índios Yawanawa, no Acre (Foto: Sérgio Vale)

Hoje, 19 de abril, é aquele famoso Dia do Índio. Data escolhida para nos lembrarmos de que nossas vidas não estão resumidas ao caos e à violência de nossas cidades. É um dia de lembrar que no interior desta nação  continental – isolados no meio da floresta - há milhares de pessoas lutando, primeiramente, para sobreviver e, depois, para manter vivos seus costumes e modos de vida milenares – mas, infelizmente, não livres da violência, esta praticada pelo próprio Estado.

Pode até ser exagero, mas me arrisco em dizer que desde o extermínio de milhares de indígenas provocado pela invasão europeia a este território hoje chamado Brasil, isso há 500 anos, este seja o momento de maior ameaça à sobrevivência das nossas populações tradicionais.

A ofensiva do governo Jair Bolsonaro (PSL) - que aglutina em seu seio o que há de mais retrógrado e arcaico em todos os aspectos - contra os direitos dos povos indígenas é algo a que o país jamais assistiu nas últimas décadas. Bolsonaro e seus seguidores acham que os índios e suas terras são um empecilho para o “desenvolvimento” do país.

Os ruralistas querem transformar as terras indígenas em grandes campos para a pecuária e a soja. Para eles, os índios vivem numa verdadeira miséria dentro de seus ricos territórios porque são massa de manobra de ONGs internacionais e de antropólogos comunistas - sim, sempre os comunistas.

Eles não entendem o modo tradicional das populações seculares. Para este grupo que hoje domina a vida política brasileira, progresso é sinônimo de floresta no chão e os índios vivendo como nós, nas cidades. Ainda bem que nossos povos tradicionais não pensam como nós, e estão lá no meio da floresta guardando a maior riqueza do Brasil: a Amazônia.

Essa mesma Amazônia que Bolsonaro quer entregar para os americanos - e isso, aqui, não é clichê anti-imperialista. São fatos. Após Michel Temer tentar e recuar na abertura da Renca para exploração mineral, Bolsonaro quer reativar a proposta.

Bolsonaro tem um discurso altamente anti-indígena; já falou que não demarcará um centímetro a mais de terra indígena, e ainda quer reaver os processos daquelas já reconhecidas. Para tanto, acabou de desmantelar a Funai: colocou uma parte sob os cuidados dos ruralistas, e outra dos evangélicos; uma agressão atrás da outra.

(Leia também entrevista com Francisco Pyiãko, liderança Ashaninka, que faz uma análise da situação indígena no país e no Acre)

Ele quer abrir as terras tradicionais para a exploração da mineração – não estranha tal defesa vir de um garimpeiro de carteirinha. Tal medida é proibida pela Constituição. Mas vindo dele, pode-se esperar de tudo o que há de pior. Explorar minérios nestes territórios causaria inúmeros prejuízos ao modo de vida das populações indígenas, sem contar os grandes estragos ambientais.

Recentemente, o governo federal tentou acabar com a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), passando para as prefeituras a atribuição de levar assistência médica às aldeias - seria a sentença de morte, vide a experiência passada.

A decisão de não demarcar terras indígenas é uma ameaça àquelas populações que ainda não tiveram este direito reconhecido - e são muitos. Elas resistem ocupando as terras, mas são alvo da ação de pistoleiros agindo em nome de ruralistas interessados em colocar seus bois e grãos naquela área.

A insegurança para essas pessoas é completa. Seus antepassados já tinham sido expulsos e mortos, e agora não conseguem reaver o direito de retomar aquilo que lhes pertence. Eles podem não ter os papéis em cartório que atestem, do ponto de vista da burocracia legal, a propriedade. Contudo, a maior prova de que eles são os legítimos donos da terra é o sangue de seus parentes ali derramado enquanto resistiam séculos atrás.

E como diz a frase do atual momento de resistência das populações indígenas: “nem uma gota de sangue a mais”. O 19 de abril é um dia de reflexão para nos lembrarmos das injustiças e atrocidades que cometemos contra os primeiros donos desta terra e, independente de credo ou posição social, lutarmos por algum tipo de reparo. A indiferença é a pior escolha.

Essa luta é de todos nós, brasileiros e brasileiras.


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